A iguana de Maragogi
A IGUANA DE MARAGOGI
Começou com um ajuntamento de gente na saída da ponte de madeira que atravessa o canal, ligando o bloco de apartamentos ao local de lazer e à praia de água morna e desprovida de qualquer discriminação: tanto banha os corpos bem trabalhados de mulheres lindas como os das outras . . .
O Zé Nunes, com seus cabelos lisos e descoloridos; o Gustavinho, com seu jeitão fleumático, olhando por cima; o Beto da Loteria do Beto e o Wilson dentista, com suas barriguinhas campeãs (sempre chegando primeiro); o Haroldo do Kit, solícito e desprendido; o Maurício da farmácia, receitando lactopurga ou elixir paregórico (tanto faz. . . depende da fé. . .) e uns gatos pingados de outras comitivas.
- Uai. . . tem um trem ali! . . exclamou o Ledir, observando o grupinho e apertando o passo.
Era uma iguana, uma espécie de lagartixa que tomou biotônico fontoura e usa um penteado seguindo a moda lançada (ou melhor, determinada) pelo Neymar.
O Wener da funerária apressou o passinho miúdo e, aproximando-se do bando nas pontas dos pés, cochichou no ombro do Botelho:
- Morreu?
O animalzinho estava assustado com aquele montão de gente e, cabeça levantada, parecia tentar entender a razão de tamanha expectativa.
- Parece qu’ela tá com a mãozinha quebrada. . . observou o Ronaldo Bié, convicto de sua afirmação.
- Chama o doutor Assad!
O Didi do Café mais o Tião Purcino, que acabavam de chegar, relembrando os tempos em que se usava terno e gravata pra andar de avião, se entreolharam desconfiados:
Tião:
- Ê, ê. . .
Didi:
- Isso num vai prestá. . .
O Marquinho Faísca, afastando o cabelo da testa:
- Acho qu’ela tá é grávida. Óia o barrigão da bicha. . . vamo chamá o Zé de Deus. . . cê num acha, Cláudio?
Nisso, vem chegando o Pedro do Zé Deco, veterinário competente e macioso:
- Engano seu, Faísca, este animal é um réptil lacertílio, da família dos igunideos. E é ovíparo. . .
- D’ôto planeta? Indagou o Pinga (vulgo Carlos Eduardo), arregalando os olhos e balançando o copo de plástico com um restinho de 5l.
- Ovíparo é qui bota ovo, seu abestado! D’ôto planeta é OVNI. . . informou o coronel Betão, cônscio da informação.
- Ôps! Falô em ovo aí? É comigo mesmo. . . aparteou o Rodrigo da Granja, já bem tostado pelo sol do nordeste.
Os irmãos Domingos e Wandeir, que faziam a caminhada do dia, pedindo a Deus que o mundo acabasse em cerveja, interromperam o papo, dizendo ao mesmo tempo :
- Tem quarqué coisa ali. Vam’vê?
O Marco Antonio do Fico, deitado na cadeira-cama, ao lado de uma barraca, no estilo “to nem aí”, olhava o mar, enquanto o Alfredo andava pela praia, tranqüilo e sereno . . .
Não sei se assustada com o burburinho ou se algum malandro pisou em sua cauda alongada, a iguana deu um estirão, abrindo caminho entre os curiosos, e sumiu no pequeno mangue, desmanchando a rodinha.
E a turma, barulhenta e de copo na mão, “despachou-se” para o lagoão.
E haja gole! . . .
alirio@uai.com.br