O QUE NÃO SE DIZ

(Crónica de um almoço de feriado)

A vida passa entre conversas que se aprazam e nos desprazam. Da mesa onde espero meu bacalhau gratinado com vegetais, contemplo a sala inteira. A pequena espera faz-se sentir sempre longa, o cheiro ao passar dos pratos por perto abre o apetite... Como querem que a gente não molhe o pão no vinho? Aqui no norte não temos o vicio do azeite...

Sabes... -disse ela- entre aquele bebé dali -assinalou com o dedo um bebé que não parava de olhar para ela e de sorrir- e aquele velho desta outra mesa não há nada, não há diferença, todos que foram isso, bebe é velho já partiram, todos... e todos que virão depois deles partirão também da mesma forma...

E eu aqui sempre preocupada por meu segundo de existência. .. -falava enquanto rebulia no bolso- Fiquei sem caneta e com mil objectos gritando-me... Passei a manhã no quintal com a force, fiz um corte no polegar da mão esquerda, pela forma do corte sei que hoje vou receber uma notícia dolorosa, mas disso não quero falar-te, teu cartesianismo não te permite entender dessas cousas....

Olha, já vem aí o nosso bacalhau -apurou-se ele a dizer, aliviado, e continuou- Queres que te deixe uma caneta?

Não, eu também como com garfo...

Concha Rousia 1/5/13