Preciso de um Acampamento

Hoje acordei sentindo no ar a frescura da manhã, sentindo por dentro algo novo... Talvez meu domingo não fosse como os outros: um domingo entediado por ouvir de longe os rumores do Faustão. Já sabia que tudo seria diferente. Vejam só, sequer acordei de ressaca!

Levantei na ponta dos pés para não acordar o pessoal lá de casa. Fiz um café bem forte - daqueles de levantar até defunto - arrumei a mesa como quem arruma as melhores jóias. Espantei-me porque nunca fui tão cuidadosa assim. Foi quando percebi que há tempos meu espírito queria voar e não adiantava aprisioná-lo. Todos os meus gestos eram grandes desculpas para a minha ansiedade. Mas, de que eu precisava? O que fazer naquela manhã? Ligar para um amigo distante? Dar uma faxina no quarto? Ouvir um som? (não poderia, meus pais estavam dormindo). Ler um livro? (não, acabei de devorar ontem "A Tenda Vermelha"). Até que tive a brilhante idéia de sentar-me na rede e escrever... Sentei, relaxei, balancei, olhei para o papel e nada. O jeito é voltar para cama e tentar dormir. Em meio a tantos desesperos e travesseiros, imaginei como meu dia seria enjoado. Talvez eu assistisse a um filme que fosse até legal, mas eu o detestaria. Aí, eu xingaria, sem motivo, a Warner Bross e ao meu pai por ter escolhido tão péssima história.

Divaguei... Divaguei... Divaguei e... Num supetão, como quem já sabia o que fazer, tomei um banho, vesti uma roupa bem leve, coloquei o boné, peguei umas frutas e miojos... Deixei um bilhete para mamãe numa objetividade tão grande que eu mesma me espantei: -"Mãe, não me espere para o almoço, nem para o jantar. Saí para acampar! Obs: o café está fresquinho."

Quando olhei para o espelho e me enxerguei toda "produzida", no estilo de que mais gosto - bem "natureba" - percebi que estava faltando o essencial: a barraca de camping, é óbvio! Peguei-a embaixo de minha cama e sumi por aí...

Andei pelos caminhos menos visitados e mais interessantes de Mimoso. Hum! Aquele cheirinho de mato e as vaquinhas no pasto era realmente tudo de que eu precisava. Eu poderia ter chamado um amigo para me fazer companhia. Mas será que ele teria a sensibilidade de acompanhar minhas divagações? Como será que reagiria ao perceber meu constante entusiasmo por estar em meio a tanto verde? Me conheço o bastante para saber que eu seria uma péssima companhia, não aceitaria qualquer assunto que se encaixasse em futilidades. Meu lado esotérico é marcante nessas horas! Há momentos e momentos. No de agora eu preciso ficar sozinha.

Arrumei um lugar bem fresco para descansar, tirei o tênis, mergulhei meus pés num riacho bem rasinho. Senti o mato ainda molhado em minhas mãos.

Levantei-me e retornei ao caminho. Horas após, encontrei o local ideal para montar a barraca. O chão, coberto de folhas secas, era plano e propício para uma boa lareira mais tarde. Havia uma gruta bem "sinistra" a uns 300 metros de onde eu estava, o que misturava medo e empolgação fascinantes. No local havia alguns pássaros desconheciods para mim até então...Passou um tempinho e montei o acampamento, catei umas goiabas e preparei o miojo no fogão a gás... Depois, deitei-me na barraca e fiquei pensando nos enigmas filosóficos da vida. Pensei tanto que não me lembro de mais nada. Será que peguei no sono? Como eu poderia dormir diante de uma natureza tão instigante?

Até que acordei com uma voz me chamando. Será que era alma da floresta? Ou eu seria abduzida? Já ouvi fatos de pessoas que saíram para acampar e nunca mais voltaram... E a voz era insistente e ecoava cada vez mais alto. Até que abri os olhos e constatei que a "Alma da Floresta" era simplesmente a mamãe, em meu quarto, me chamando para almoçar... Meio desnorteada, vi que ainda estava em minha cama (de pijama) e lembrei que peguei no sono quando divaguei... Divaguei... Divaguei...

O sonho foi perfeito e lembrá-lo fez mais alegre o meu domingo... Pena que não pude acender a fogueira, nem ver a lua tão enigmática no céu... Quem sabe num próximo sonho eu possa viver essa emoção?

Renata Mofati
Enviado por Renata Mofati em 29/03/2007
Reeditado em 09/04/2007
Código do texto: T430078