Quatro gerações: Minha Avó Joana, minha Mãe, minha filha e eu.


         Cheirinho de Alfazema e Rugol

 
Adorava visitar a minha Avó, principalmente no meio da semana. Com tanta gente visitando ela no domingo, ficava difícil conseguir qualquer atenção dela, principalmente se tivesse visita, ainda mais do seu irmão querido que morava em Osasco.

No meio da semana era bem melhor e se chovesse melhor ainda por que a minha Vó fazia chá de erva cidreira fresquinha que ela cultivava no jardim e bolinho de chuva! Eu descia lá do Sumaré até a Pompéia a pé imaginando o que minha Vó e eu íamos fazer e conversar naquele dia.

Minha avó se chamava Joana, aliás, as minhas duas avós se chamavam Joana mas eu tive mais contato com a Mãe da minha Mãe. Além do mais, todo mundo falava que eu era parecida com a minha Avó e eu queria muito descobrir o que era que nós duas tínhamos em comum por que na verdade, eu não via nada!

Bom mesmo era quando a minha Vó e eu ficávamos no quarto dela conversando enquanto ela costurava. Ela sempre tinha algo para consertar ou acabamentos por fazer. As vezes eu a ajudava desfazendo barras ou cortando algum molde. Parada era que eu não poderia ficar. Enquanto ela costurava e eu desfazia a barra de alguma calça de um dos meus tios ou primos, a minha Vó contava sobre a infância dela no interior do Sul da Bahia. Ela contou das dificuldades que tivera que enfrentar por causa da perda precoce dos pais e como ela e seus irmãos eram judiados pelos parentes. A estória dela era mesmo triste que nem gosto de lembrar.

O tempo foi passando e sempre que encontrava um tempinho, fugia pra casa da minha Vó para desfrutar da companhia dela. Quando eu comecei a trabalhar era melhor ainda por que eu conseguia dar um fugidinha lá da escola e ir até à Pompeia com uma caixa de biscoitinhos da Confeitaria Dulca da Vieira de Carvalho perto da Praça da República. Minha Vó adorava comer os biscoitinhos mas ela ficava mesmo encantada era com a beleza e delicadeza dos biscoitinhos que vinham numa caixa toda enfeitada e amarrada com um lindo laço. Ela sempre reclamava de eu gastar dinheiro à toa com esta bobagem mas no fundo eu sabia que ela gostava do nosso momento juntas e dos biscoitos tanto quanto eu. Fazia o nosso momento mais especial ainda.

                        

O que eu odiava mesmo era quando eu tinha que dividir a minha Vó com alguém e veja bem, eram inúmeros primos além do tal irmão que que vinha lá de Osasco. Talvez não fosse ódio mas ciúmes de ter que compartilhar esta mulher com tantos outros principalmente sabendo que eu tinha muita coisa a ver com ela e tinha fome em conhecê-la melhor para então me conhecer também.

Eu não gostava muito quando certas primas dela faziam aquela visita mensal. Algumas delas cheiravam a remédio, outras a Gelol e porque não dizer aquele cheirinho de xixi. Naquela época muitas mulheres tinha incontinência urinária (bexiga solta, né!) por causa das gravidezes ou excesso de peso. Os homens, bem, eu realmente não sei qual seria a razão mas naquela época eu achava que era pura preguiça e safadeza deles.  Mas a minha Vó não cheirava nada assim. Ela cheirava à alfazema e as vezes eu sentia aquele cheirinho de leve do creme Rugol que ela passava sagradamente no seu rosto e nas mãos. Segundo ela, seu segredo para manter sua pele alva e jovial. Quando entrei na casa dos trinta nem pensei duas vezes! Fui logo providenciando um latinha de Rugol! Cheirinho bom de alfazema e Rugol. Cheirinho bom da minha Vó. 

Um sábado, no mês de fevereiro, minha aluna Laura apareceu com alguns presentinhos. A danada não havia esquecido do meu aniversário mesmo estando longe lá em Portugal com a irmã Luíza e os pais. Ela trouxe uma pulseira tipo terço feito com pedras de ametista, um batom Radiant Rose da L´Oréal e um lindo xale português. Da Luíza recebi um livro de Jean-Christophe Grangé, "O Império dos Lobos" e uma linda toalha de cozinha com o famoso Galo de Barcelos. Fiquei muito comovida pelo fato delas terem se lembrado de mim. Agradeci os presentes e comentei que não me importava em envelhecer. Só não queria cheirar a remédio, Gelol e nem xixi. A Laura tomou minhas mãos nas suas, deu uma cheiradinha e disse, "Que nada Teacher ... você tem cheirinho bom de 'Strawberries & Champagne' da Victoria´s Secret e de vó!"

É, pensando bem, prefiro Victoria´s Secret rsrsrs ...

 
Calada Eu
Enviado por Calada Eu em 30/05/2013
Reeditado em 23/08/2013
Código do texto: T4317054
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