* A prova acabara de começar.
 
Minha amiga, na véspera, não resistiu ao convite de uma festa que prometia ser animada.
A animação foi confirmada, mas resultou num sono irresistível.
 
Ela topou fazer a prova porque um colega de trabalho a incentivou:
_ Não perca essa chance! Concursos facultam os melhores empregos.

Ouvindo tais palavras de incentivo, ela realizou a inscrição.

Sabemos, porém, que isso nada adianta se o candidato não estuda.
Os atuais concursos apresentam uma enorme concorrência.
É fundamental levar muito a sério.
 
* Meu texto não tem a ver com o despreparo de minha amiga.
 
A vigilância da prova era efetuada por dois fiscais, um homem gordo, com cara de comilão, e uma mulher magrinha.
Cerca de três minutos após começar a prova, um rapaz, sentado no fundo, se levantou falando alto:
_ Está errado! Está errado!
 
Pedindo calma e silêncio, o fiscal gordo foi até o fundo da sala.
O rapaz continuou sem conter a voz.
_ A questão sete de Matemática contém um erro, está faltando uma informação importante!
 
O fiscal gordo esclareceu que, confirmando o erro, a questão seria anulada. Voltou a pedir calma, porém o rapaz exaltado insistiu.
_ Tem que anular! Está errado!
 
Alguns candidatos começaram a reclamar do barulho.
Uma moça surgiu convocada pela fiscal magrinha.
Gentil a moça pediu ao rapaz que ele continuasse fazendo a prova.
Não adiantou.
_ Tem que anular a questão!
_ Calma, senhor! Termine sua prova, depois elaboramos um documento anotando a sua queixa.
A moça falou firme, contudo não conseguiu acalmar o queixoso.
_ Nada disso! A questão tem que ser anulada imediatamente.
 
Ninguém conseguia se concentrar na prova.
Minha amiga observava tudo sonolenta.
Um candidato, com cara de japonês, ouviu a seguinte pergunta:
_ E aí, japa? Tem algo errado na questão sete de Matemática?
 
O “japa”, parecendo não gostar da indagação, nada disse.
Quem perguntou foi um homem vestindo uma camiseta vermelha.
 
* Logo vieram mais duas pessoas almejando resolver o problema.
Solicitaram que o rapaz fosse até a sala da direção, ele não quis.
Uma das fiscais procurou compreender o que ele reivindicava.
_ Está faltando o X, minha senhora!
 
Nesse instante, o fiscal gordo decidiu sair, aproveitando a presença dos outros fiscais.
Provavelmente ele deve ter ido comprar alguma merenda.
Os gordos não ficam muito tempo sem beliscar algo.
 
* Eu agora aproveito para entender os detalhes desse episódio.
 
O rapaz afirmou que faltava o X!
Está bastante esquisito!
 
Por quê, Ilmar?
O que te incomoda, rapaz?
 
Eu leciono Português, contudo adoro Matemática.
Já dei aulas informais de Matemática, as famosas “bancas”.
Eu diria que Matemática seria uma deliciosa amante caso eu fosse casado com a Língua Portuguesa.
 
Que papo é esse de que falta o X?
Os problemas matemáticos pedem exatamente o X.
Por acaso, o nosso candidato indignado estava pensando em obter a resposta da questão?
 
Eu confesso que fiquei confuso, pois, para complicar a situação, o japa parece que estava por fora.
Os japas possuem fama de sabidos.
Quando observamos um japa, sempre imaginanos alguém estudioso.
Por isso ele ouviu a indagação referente à questão.
 
Esse japa da sala parece que não é autêntico.
Será que ele é um japa paraguaio?
 
* Minha amiga me informou que, depois de dez minutos, o gordo retornou segurando um copo de refrigerante quase vazio e comendo um salgado qualquer.
 
Eu falei! Eu falei!
Os gordos sempre estão comendo.
 
* A discussão não cessava.
Todos, incluindo o japa paraguaio, acompanhavam o debate.
 
Surgiram outros fiscais tentando resolver o conflito.
Finalmente conseguiram levar o queixoso para fora da sala, entretanto a prova não foi reiniciada.

Aproximadamente dez minutos correram, o candidato voltou.
_ Eles prometeram encaminhar a reclamação. Desculpa aí, galera!
 
A prova recomeçou.
Combinaram somar o tempo perdido com o horário do término.
 
Minha amiga não conseguiu resolver a tal questão sete.
Aliás, ela conseguiu resolver poucas questões.
 
Não pude verificar a bendita questão, pois ela não desfrutou o direito de sair com o caderno de questões já que saiu antes do tempo estabelecido para levar o caderno.
Ela também não soube me dizer o nome do concurso.
Isso dificultou que eu fizesse uma pesquisa.
 
Eu a perdoei, pois ela estava sendo coerente com o desinteresse dela.
Minha amiga (prefiro não dizer o nome dela) precisa amadurecer.
 
Eu a perdoei e tolerei suas atitudes, no entanto fiquei curioso demais escutando a narração.
 
* Um rapaz reivindicou anular uma questão, pois faltava o X!
Um japa, de sangue paraguaio, nada disse sobre o problema!
Um fiscal gordo só estava pensando em satisfazer sua gula.
 
Refletindo sobre a ocorrência, tentei me tranqüilizar, pois a questão era de Matemática.
Se fosse alguma questão de Português, seria a praia que mergulho, merecendo, então, minha inquietação.
 
Infelizmente o meu conforto acabou rápido.
 
* A questão era de Matemática, entretanto a confusão parece estar relacionada à interpretação de texto.
É possível que o rapaz indignado tenha interpretado errado a questão.

Se o candidato não soube interpretar, os culpados são os professores de Português.
 
E agora, José?
 
Minha amiga, desleixada demais, foi fazer uma prova, havia uma questão de Matemática que causou uma confusão motivada pela má interpretação de um rapaz, sugerindo que as aulas de Português que o candidato recebeu falharam.
 
Não teve jeito!
Eu acabei me sentindo culpado.
 
* Minha amiga disse que esse fato ocorreu no início do ano.
Ela me contou isso há dois dias.
Eu tentei pesquisar o assunto, desejando descobrir pistas que me fizessem encontrar a questão.

De alguma forma eu precisava me redimir.
Na condição de professor de Português, eu objetivei expiar a minha previsível culpa.
 
Não tive êxito!
Frustrado eu decidi dividir o fato com vocês.
 
* Parece que nunca saberemos qual foi o X da questão.
 
Se o falso japa, um verdadeiro paraguaio, parece que nada sabia, talvez seja uma grande presunção minha desejar solucionar o problema.
 
Eu somente sou capaz de garantir que o fiscal gordo seguiu comendo guloso e indiferente.
 
Ah! Com X ou sem X , eles sempre comem.
 
Um abraço!
Ilmar
Enviado por Ilmar em 03/08/2013
Reeditado em 04/08/2013
Código do texto: T4417252
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