Crônica XXVII - O Tenor e a Mochileira - Parte II

Ana Esther

Naquele ano, 1997, a Mochileira Tupiniquim estava morando em Passo Fundo (RS) e tinha uma colega chilena Professora de Espanhol, muito querida e entusiasmada, que a convidou para irem juntas ao show do tenor José Carreras nas Missões. Imperdível, naturalmente. A Mochileira era fã do tenor e até já havia ido ao show que ele fizera em Curitiba [O Tenor e a Mochileira – Parte I] e mesmo exausta com o final de semestre e seus trabalhos intensificados ela decidiu “reincidir” e ir novamente ao encontro do ídolo.

Com sua fiel mochila a Mochileira e a amiga pegaram o ônibus de excursão em Passo Fundo e se tocaram para um dos Sete Povos das Missões, São Miguel das Missões (RS) pela estrada que cortava coxilhas verdejantes, uma sensação grande de paz!O objetivo era chegar lá ainda com dia claro para poderem curtir um pouco da beleza das ruinas históricas. Histórico seria também o concerto com o tenor tão amado por todos os amantes da música e um momento como esse transformou até o visual do lugarejo. Vários ônibus chegando à cidade quase que ao mesmo tempo, parando próximo ao local do espetáculo em um enorme estacionamento a céu aberto, trazendo centenas de pessoas...

As amigas e colegas de excursão mal puderam aproveitar para fotografar as imponentes ruinas sobreviventes da Igreja de São Miguel das Missões, circular por inúmeras banquinhas de bugigangas (suvenires) e comilança e já era hora de entrar na fila. Durante a fila, melhor horário para “jantar”, beber água e ir ao banheiro portátil, eh, eh. Desta forma ninguém precisaria se incomodar quando José Carreras estivesse cantando!

E o sol foi caindoe a diferente luminosidade ia modificando os tons da coloração das ruinas marrom-avermelhadas por si só um show fenomenal. Quando a área das cadeiras e do povo em pé foram liberadas, todos correram para se acomodar enquanto ainda esperavam pelo início do concerto. Papos entusiasmados sob um céu negro que aos poucos se enchia de estrelas brilhantes. As ruinas da Igreja com a escuridão adquiriam uma atmosfera de filme de terror, mesmo em meio a tanta gente, testes de som, andanças para lá e para cá...

Até que iniciou o concerto! A orquestra, o maestro e o tenor José Carreras muito simpático e combinando com o ambiente. Embevecida pelas famosas árias e canções clássicas selecionadas, com seus toques fortes, a voz do tenor, o céu estrelado e com as ruinas por palco a Mochileira Tupiniquim foi transportada (com mochila e tudo) para a época das missões jesuíticas, uma época em que aquele palco testemunhara muitas lutas, mandos, desmandosesofrimentos de índios guaranis, jesuítas, espanhóis, portugueses...e brasileiros. Séculos depois, lá estava o José Carreras com seu talento cantando o amor entre os povos, abençoado talvez pelo espírito vigilante do Sepé Tiarajú pairando sobre as ruinas da catedral... Viva!!!