* O meu bairro é periférico, praticamente desprezado pelas elites de Salvador, no entanto, entre outras coisas, possui três agências bancárias famosas, tem maternidade, um grande hospital e um comércio agitado.
 
Encarando uma grande fila do Itaú, vivi, na última terça, uma aventura hollywoodiana a qual pretendo resumir a partir de agora.
 
* A primeira coisa que merece destaque é o desrespeito do banco.
 
Nessa agência há cinco caixas disponíveis, porém funcionavam dois.
Existia o preferencial e um caixa com uma funcionária eficiente.
 
Às vezes observávamos uma terceira pessoa atendendo.
Ela demorava um pouco, saía, sumia, depois reaparecia.
 
A fila estava grandinha e, quando a atendente “indecisa” desaparecia, crescia mais ainda.
 
* Compondo a fila, foi possível perceber vários perfis interessantes.
 
Na minha frente tinha um cara resolvendo palavras cruzadas.

O rapaz parecia experiente, pois agilizou a página que estava tentando desvendar. Restava pouco espaço na folha.
Ele coçava a cabeça, parava pensativo, não desistia.
Quase pedi para dar uma olhadinha.
 
O rapaz pulou para a página seguinte.
“Otário!”, eu pensei.
Opa! Os desafios propostos foram resolvidos, dessa vez, com agilidade.

Pude perceber que o “amigo das cruzadas” ficou orgulhoso.
Ele sorriu, provavelmente pensando:
“Tá vendo? Eu sou bom, bigodudo!”.
 
* Quase na ponta da fila, havia um cara que ia e vinha, conversando com outro, atrás dele, ficando igual a uma barata tonta.
 
Considerando que a fila desorganizada formava um círculo, ele foi parar na parte central, fora da fila.
Se colocasse uma cadeira, bastava a gente fazer perguntas à aparente celebridade, nós teríamos o tradicional Roda Viva da TV Cultura.
 
Misturando realidade e ficção, me preparei para fazer a minha pergunta ao “entrevistado”, porém ali não era o Roda Viva.
O cara não era uma celebridade, mas um simples tagarela inquieto.
 
* Nessas horas infelizmente há pessoas que maltratam a ética.
 
Tentando ganhar tempo, usam os baixinhos da maneira mais vil possível. Aparecem carregando criancinhas.
 
O que elas tramam?
Utilizar a fila prioritária.
 
Oba! Quis o destino punir os sabidos nesse dia.
 
* O caixa prioritário atendeu todos e passou a convocar a outra fila.
 
De repente surgiram velhos e apareceu um malandrão, com cara de Tom Cruise, trazendo uma criança nos seus braços.
Ele escolheu a fila especial.
 
Sobrou!
O rapaz o qual estava sendo atendido, convocado quando a fila esvaziou, resolveu pagar as contas atuais, as do próximo ano e não hesitou em quitar os débitos de 2015.
O sujeito roubou muito tempo.
 
Imaginei dizer ao Tom Cruise “Você sobrou!”, contudo me controlei.
 
* Como ignorar os papos?
 
O pessoal conversa alto demais, exagera o tom de voz, excede o limite do som agradável e suave, esquece a delicadeza quando solta as palavras.
Enfim, o pessoal grita.
 
No meio das reclamações, fofocas, piadas e comentários sobre as novelas, o burburinho é intenso pra caramba.
 
* Eu me distraio com um tocador de MP4.
 
O aparelho cabe no bolso da camisa.
 
Nessa terça estava ouvindo algumas músicas internacionais românticas.
Enquanto as pessoas tagarelam, esperam, participam ou não do Roda Viva, resolvem palavras cruzadas, tentam usar a fila dos velhos, eu sigo escutando minhas músicas preferidas.
 
É muito legal!
 
* Após o rapaz sair da fila prioritária, invadida pelo astro malandro, os velhinhos voltaram a desfrutar um atendimento rápido.
 
Chegando a minha vez, Frank Sinatra cantava New York, Nem York.
Eu estava quase dançando no ritmo da canção, mas parei, desliguei o MP4, guardei no bolsinho e me livrei de um débito atrasado.
 
O craque das cruzadas e a celebridade do Roda Viva já haviam saído.
O Tom Cruise não demoraria.
 
Eu precisava ainda almoçar antes de ir ao trabalho.
 
Constatei, então, que minha cota de emoções, apesar das canções tão gostosas e envolventes, esgotara.
 
* Recordando o fato, deduzi que a presença do Tom Cruise brasileiro sugeria uma tarefa, uma missão simples e possível (impossível seria caso o ator fosse o original).
 
Por que não descrever o episódio através de um texto?
 
Abracei o projeto sem medo.
Mergulhei fundo.
 
Tomara que vocês aprovem!
 
Um abraço!
Ilmar
Enviado por Ilmar em 19/10/2013
Reeditado em 19/10/2013
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