ESCRITO NAS ESTRELAS

ESCRITO NAS ESTRELAS

Como de costume, José levantou bastante cedo e apreciava o cortejo de querubins desfilando pelas alvas nuvens celestiais. Preocupava-se. Percebia que seu filho, lá na Terra, não era feliz. O menino andava meio atrapalhado na vida amorosa, sem saber qual trajeto deveria seguir.

- O que foi, Zé? Perguntou Osmundo, chegando de chofre.

-To preocupado, Osmundo... To preocupado.

- Não me chame de Osmundo, que eu não gosto.

- Ué, mas seu nome não é Osmundo?

- É, mas você nunca me chamou pelo nome. Aliás, ninguém me chama pelo nome. Você sabe que odeio meu nome. Meus amigos me chamam de Frei.

- Tá bem... Se é assim que você prefere, não chamo mais. Afinal, anjos não brigam e sempre fomos tão amigos.

- Me conta Zé, tá preocupado com o quê? Nós não temos com o que nos preocupar. Aqui no paraíso temos tudo, não precisamos de bens materiais, táxi, mercado, dinheiro, política, essas coisas mundanas lá de baixo. Nossas únicas preocupações são...

- Os parentes, os filhos, os netos que lá deixamos.

- Perfeito, Zé. E o que te aflige?

- Aquele meu filho anda meio perdido lá pela Terra. Parece que não sabe o que quer da vida.

- Você está se preocupando à toa. Os homens são volúveis. Nós também fomos...

- Eu sei, Osmun... Quero dizer, Frei.

- Assim é melhor. Frei eu gosto que me chamem.

- Como dizia, o menino anda dando umas cabeçadas. Não encontrou a pessoa certa para ficar com ele.

- Ah! Zé. Dá um tempo. Fica aí se preocupando com bobagens. Ele é adulto e sabe o que faz. Imagine se eu ia ficar me preocupando com os casos amorosos dos meus filhos, netos, sobrinhos... Sobrinhos? Ei! Lembrei de uma coisa, Zé, falou Osmundo batendo com a mão na testa.

- O que foi, Frei?

- Lembrei da Fafá. Meu Deus! Lembrei da Fafá.

- Não sabia que você era fã da Fafá de Belém.

- Que Fafá de Belém, Zé. Fafá minha sobrinha... Tá sozinha, sem ninguém.

-Ué, não é você que não se preocupa com os parentes lá da Terra?

- Não enche, Zé. Não me atrapalhe. Estou pensando.

- Pensando no que, homem?

- Pensando que teu filho e minha sobrinha podiam se encontrar.

- É difícil, Osmun... Frei. Aquele meu filho é muito teimoso. Não gosta que tomem decisão por ele.

- Ah! Zé... Damos um jeito de eles se encontrarem.

- Mas como, Frei?

- Redes sociais.

- O que é isto? Um novo programa do Governo?

- Benza Deus, Zé. Nada a ver.

- Se tiver política no meio, to fora.

- Facebook, Instagran, Badoo, essas coisas, Zé. Como você está desatualizado.

- Não precisa apelar e dizer palavrão, né Osmundo.

- Osmundo é a PQP!

- Desculpe... Saiu sem querer.

- Vou fazer a Fafá entrar no Badoo. Já vi que teu filho já tá lá, o malandro.

- Malandro, não. Ele é um bom menino.

- Tá bom, Zé... Eu sei.

- O problema é que a Fafá não mexe com essas coisas de redes sociais. Vou ter que dar um jeito.

- Veja se ela não tem uma amiga que faça por ela.

- Imagine se eu faria isto. Nunca. Ao invés disto vou pedir para uma amiga que faça a inscrição para ela.

- Pois foi o que eu disse, Osmun...

- Se terminar a palavra vai ouvir palavrão.

- Se contenha, Osm... Não fica bem para um anjo ter a boca suja.

- Nossa! Gostei da carinha deste rapaz, amiga.

- Manda um recado para ele, Fafá.

- Será que fica bem? Acho meio chato tomar a iniciativa, mas parece que tem alguém falando no meu ouvido... "Manda... Manda".

- Então, manda, oras.

- Vamos ver: "Por gentileza. Acho que temos muitas coisas em comum, além da profissão. Veja meu perfil e se interessar entre em contato".

- Perfeito, amiga. Recado claro e direto.

- Ai, será que ele vai gostar? Perguntou Fafá com uma vozinha quase infantil.

A cachorrinha Fox Paulistinha, ao lado, balançou a cauda alegremente. Quem sabe sua dona arrumasse alguém para levá-la passear nas manhãs, em um belo parque cheio de quero-queros e sabiás.

À noite, Zezinho abriu o Badoo e lá encontrou o recado de Fafá.

- Hum! Interessante esta moça. Sorriso simpático, jeito alegre. Credo! Mas está cheia de roupa. Parece que está na Europa em pleno inverno. Epa! O portão de Bradenburgo. Claro! Ela está na Europa. Será que respondo a mensagem dela? Acho que vou deixar para amanhã.

- Amanhã, não. Hoje... Hoje.

- Ué. Agora dei de ouvir vozes. Acho que foi impressão. Amanhã vou responder...

- Hoje! EU DISSE HOJE!

- Tá bom... Hoje. Agora dei de falar sozinho também. Vamos lá: "Prezada Fafá. Também gostei de você. Quem sabe pudéssemos nos encontrar no sábado. O que você acha?"

Lá no céu, ribombaram raios coloridos. Frei e José comemoravam o sucesso da empreitada.

- O QUE É ISTO? QUE BAGUNÇA É ESTA? AQUI NO CÉU NÃO PODE FAZER BARULHO. Era o chefe chamando a atenção dos dois por causa dos estrondos dos raios.

- Veja como é a vida, Zé. Agora temos que obedecer as ordens de um cabeludo.

- Ele é gente boa. É o chefão mas é humilde.

- Verdade!

Fafá e Zezinho estão felizes. Um completa o outro. Osmundo, ou melhor, Frei e José não param de se cutucar.

- Eu sabia que daria certo, afirma José.

- Ei! A ideia foi minha, não sua.

- Que importa de quem foi a idéia? Veja como eles estão felizes. Não é bonito de ver?

- Com certeza. Seu menino e minha sobrinha têm tudo para ter a felicidade ao lado.

- Você tem razão, Osmundo.

- Osmundo é a ...

- Não termine... Olhe ali o patrão de olho em nós de novo. Tá bom, meu amigo? Estou feliz por eles e também pela nossa eterna amizade.

- Desde que não me chame de Osmundo.

- Mas tá ficando um anjo ranzinza, hem?

Homenagem aos grandes amigos, saudosos Osmundo Frei Larocca e José Augusto Gaspar, tio da Fátima e meu pai, respectivamente.

CLEOMAR GASPAR