CRUZADOS NOVOS

Acaso há justiça onde há amor?

às vezes me ponho a questionar quão injustas são as relações afetivas vigentes. Ora, vejamos: conhecemos alguém, nos apegamos e logo aquela pessoa que outrora nem sonhávamos que ocupava alguns centimetros quadrados sobre a terra ganha prontamente, um espaço relevante e ímpar nessa mãozinha fechada que temos do lado esquerdo da caixa toráxica.

Este ente estranho,agora, não só tem nome, como apelido. Apelidinho. E agora, de um modo incógnito para nós mesmos, queremos agradá-lo, cuidá-lo, mimá-lo.

Queremos vê-lo do nosso lado nas fotografias, apreciarmos seus atos bobinhos como o de enxugar a pizza do excesso de gordura antes de comê-la, banhar o sushi de molho shoyo dos dois lados. Cultivamos o amor pelo sotaquezinho fofo ao dizer “sagitarius” em inglês, e quando o ser amado canta errado a música do Djavan.

Tudo isso enche, de repente, a vida de uma graça nunca antes imaginada, de uma alegria totalmente surda a qualquer racionalidade que nos venha a dizer: “não se entregue tanto”.

Equando esse querer nos volta?Deus! Não existe vontade outra, querer outro, ‘Outro’ outro! Não existe mais espaço ou tempo, peso, ou medida. Só a exultação descoordenada e epiléptica de estar junto: tomando um pó de guaraná, ouvindo o palhaço da Terapia do Riso tentar vender cartões no ônibus, ensinando a jogar Paciência Spider…

Aí, em um dia, nada belo, indolente, desocupado, rebelde-sem-causa, o amor inventa de acabar. Melhor: o amor não! A relação inventa de acabar. O amor continua lá. Igual a dinheiro recolhido. Cruzados novos. Existe, mas não vale nada, não há loja que receba. Um dia valeu muito, foi juntado dentro do colchão, trocado por bens e serviços, mas agora que não há quem receba, não passam de pedaços de papel que alguém se deu o trabalho de projetar, dar cor, design, atribuir valor para, um dia, descobrir que terá de esquecer. Que não passa de uma excentricidade apegar-se ao que é antigo. E fim. Lide, com isso.

Daí tanto medo e tanta vontade de não dar a mínima para a felicidade a dois. Essa falta de coordenação motora entre o sentimento e a razão é mote pra mim, pra você pra Shakespeare, pro dono do bar, pros amigos que dizem “ ainda não esqueceu?”.

Adiante! Afinal, lembrar do que deu certo, do que foi bonito, é ruim pois foi cultivado justamente para ter que ser esquecido!! Faz sentido?

Esqueça e crie outra moeda.Um real. Pode começar você. E se der certo, me avise.

Juliana Santiago
Enviado por Juliana Santiago em 10/01/2014
Código do texto: T4644736
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