Sábado Urbano
 
Eu e estas ruas; ruas pouco tumultuadas nesta manhã de sábado; sábado que saio às ruas para olhar, cheirar, sentir, ser parte integrante deste tempo; tempo lento em sua insaciável velocidade. Onde estou? O que faço por estas ruas, dentre lojas e apetrechos coloridos em trocas de olhares? Será que procuro algo, alguém, distração, emoção, ou apenas quero respirar a cena desta tão pura realidade? Eu não sei. O que sei é que hoje é sábado e estou solto pelas ruas desta cidade gigante, repleta de histórias, de segredos que - neste “sebo” - em que procuro alguma obra de Roberto Bolãno – escritor chileno - deparo-me com um livro de João do Rio; o qual me furta alguns momentos e me fala de outro Rio. Não, ele fala deste mesmo Rio de janeiro, no qual eu me encontro agora. Só que João fala de outro tempo; com outras características, com outras marcas, às marcas de seu tempo...

E, é hora de prosseguir por ruas a mais, perfurar outros olhares, outras percepções, e, assim, em outros “sebos” nas proximidades da Praça Tiradentes – ah – estive por aqui dias atrás, solto na folia carnavalesca, mas isso é outra crônica da vida, pois hoje; hoje caminho sozinho por estes espaços sociais. A praça mostra sua aparência atual; modificada, um tanto mais atraente. E, sou instigado a prosseguir e desvendar. Percorrer becos e vielas e construções antigas e pessoas atuais e sorrisos soltos na face desses garotos que passam por mim, soltos na efervescência do viver...

O clima está tão agradável; tão bom para caminhar, observar, transpirar os aromas dos instantes. Hum, strep-tease em oferta, num cinema qualquer. O sexo flutua por minha cabeça em momentos. Ha, ha, ha. Não, estou tão leve, tão puro enquanto contaminado que – quero seguir – ir mais, outros passos... Assim, sigo. Vou dentre pedestres apressados que cortam as tantas esquinas de nós...

Largo da Carioca - o miolo da cidade. Um aglomerado se forma: são gringos, e, uma garota, brasileira, guia de turismo - em inglês - discorre sobre a cidade. São relatos desta cidade localizada às margens do imenso mar, que se mostra tão plena, tão conflitante, tão encantadora, tão possível, tão mesclada. Agora está iluminada pelo sol aconchegante, deixando nossos olhos irem ao longe e captar imagens e pessoas e prédios e, eu, quero fotografar, assim, tiro uma foto deste tempo de hoje, neste dia, neste sábado que caminho a esmo sem saber onde vou parar...

Adentro o centro cultural da “Caixa” e a exposição “Assim vivíamos” traz fotos doutros tempos de uma União soviética não mais existente. São fragmentos com recortes de pessoas em situações tão diversas, em momentos descontraídos, que nos prendem pela sensibilidade poética das fotografias, e viajamos na passagem do tempo dentre rostos e lugares desconhecidos, ou modificados. São cenas em instantes já mortos que se mantem vivos apenas no registro inesquecível e marcante e sensível e distante, e distante, e distante... E, noutra sala de exposição, deixo meu corpo cair sobre almofadas e dois atores no vídeo, discorrem diálogos fragmentados onde o sentido é o sem sentido, mas que dá sentido em sermos, em estarmos, em fazermos parte do incompreensível. E logo após sou penetrado pela exposição “Voz” e escuto o barulho do mar indo e vindo em suas metamorfoses, e, não quero entender nada, só quero sentir, e sinto, e consumo e sou consumido em ondas incertas nas espumas do mar; vasto mar... Então me olho e, paralisado, estagnado, sinto qualquer melodia fluindo em mim...

Ruas e ruas, e livrarias, e constatações tão reais que logo se desfazem no vendaval imparável das horas; nesta hora atual quando meu telefone toca e, converso, e sorrio, e marcamos algo para logo mais em outras diversões, com outras sensações, neste movimento incessante do tempo, em nós, em nós, em nós...
Valdon Nez
Enviado por Valdon Nez em 30/03/2014
Reeditado em 19/10/2020
Código do texto: T4750096
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