Minha história

Eu sinto uma urgência em escrever. Mas me pergunto muitas vezes, "por que?", se nem mesmo sei para quem estou cuspindo essas palavras.

Grande parte de mim sabe que esse desejo é principalmente uma esperança ingênua de ter de fato uma grande história a contar. Eu me refiro a algo que valha relatar em uma carta que futuras gerações talvez encontrem um dia.

Mas, na realidade, tenho apenas dias normais, cheios de momentos mornos. E às vezes sentimentos excitantes que são também familiares a toda criatura urbana que compartilhou comigo das últimas três décadas nesse mundo. Tudo o que possuo é a vida que milhões de outras pessoas vivem por aí.

Sou a criança animadíssima para as férias de verão e brinquedos novos. Correndo e andando de bicicleta como se isso fosse a mais plena liberdade e que me permitisse conquistar o mundo.

Sou a adolescente obcecada como uma "boyband". Planejando um ato de rebeldia a cada semana e brigando com minha mãe porque quero constantemente a doce independência de um adulto ao mesmo tempo em que exijo ser paparicada como uma criança que requer cuidado e comida na boca.

Sou a garota que eventualmente passou a querer a atenção dos meninos interessantes. A curiosidade em descobrir porque esse tal de "amor" é um sentimento tão popular.

Sou a aspirante a mulher madura que se olha no espelho, idealiza um corpo perfeito e percorre caminhos obscuros para conquistar a barriga lisa e a bunda dura.

Sou a jovem adulta na universidade, metade to tempo estudando e a outra metade nos corredores do campus conversando sobre mim e sobre os outros. Quatro anos até que eu me torne um dos muitos graduandos que arruma um trabalho após o outro, sem jamais construir uma carreira.

Devido à frustração com o presente, e na ânsia por uma aventura e um novo começo, sou uma das pessoas que decide morar fora do país por um ano. Em fazer isso, eu me torno mais um exemplo de tantas pessoas que convertem temporário em permanente e tenta construir uma vida no "estrangeiro".

Como num piscar de olhos, eu caí nesse imenso grupo de gente que abandona a nação em desenvolvimento para explorar as maravilhas e a chiqueza da América do Norte. Eu até me casei com um gringo.

Essa decisão encheu minha vida com o tipo de amor com o qual sonhei desde nova - inspirada nas princesas da Disney e seus contos de fada. Minha história mudou muito além do que imaginava, mas virei uma entre tantas pessoas sofrendo com a distância, com esse sentimento que inglês não traduz, mas que nós, brasileiros, batizamos de saudade.

Falar da minha vida nesses pedaços mostra claramente uma narrativa que se escuta todo dia, em tantos cantos do mundo. É apenas a louca combinação desses fragmentos e a riqueza de detalhes que se esconde nas entrelinhas que talvez, talvez, pinte minha vida como um quebra-cabeças único e exclusivo.