Figura de Linguagem

Não sei quanto aos outros escritores, mas eu aprendi a escrever lendo coisas quase tão interessantes quanto listas telefônicas. Deixe eu explicar direito: foi lendo todos os grandes clássicos da literatura imortal que eu aprendi como esse troço não deve ser feito. Dostoievsky é um saco (eu o chamo de “Mestre Supremo dos Diálogos Inverossímeis”). Kafka é legal por causa de sua simplicidade, mas o dito grande mérito de sua obra para mim é o mesmo que ter de desamarrar a porcaria do sapato para calçá-lo. Camus podia ter sido melhor se não tivesse lido tanto do Dosto e se não achasse que posar para fotos tinha algo a ver com literatura. Ernest Hemingway era simplesmente um bêbado idiota. Eu sei que O Velho e o Mar é um péssimo exemplo de sua obra, mas, convenhamos: Pfff... Eça de Queiróz que me perdoe, mas eu já li coisas mais intrigantes em rótulos de pastas de dente. E sobre Machado de Assis, bom, pelo menos ele tinha senso de humor.

Também posso meter o pau em quem meio que recentemente caiu nas graças do público brasileiro, e agora vendem seus livros até em lojas de conveniência em postos da Shell. Estou falando do velho cafa. De repente é cool gostar dele, e todo mundo que gosta dele acha que está por dentro de alguma coisa, mas não, baby, veja bem, não é toda sua obra que vale a pena. Se na maioria dos contos e poemas ele faz bonito como poucos fizeram, o mesmo não se pode dizer de seus ensaios e romances (novelas). Nenhum de seus romances convence por inteiro; você tem de tirar um pedaço aqui, outro ali, muitas vezes capítulos inteiros. Quanto aos seus ensaios, acho melhor nem comentar. “Ah, mas você não foi influenciado por ele?” Já posso ler seus pensamentos. E digo: Sim. Mas não só por ele, como querem alguns leitores que carecem de base de comparação. Que tal Vonneguth? James Ellroy? Hunter S. Thompson? Murakami? Chandler? Wilde? Fante? Salinger? Aquela bichona do Bret Easton Ellis? William Gibson? Don Wisllow? Músicos Folk e Rappers Norte-americanos das antigas? Compositores alemães e russos de música clássica? Free Jazz, Cool Jazz e Bebop? Conversa de boteco e discussão com mulheres horríveis às quatro da madrugada? Também encontro sérios problemas nos trabalhos de todos esses (os escritores que citei no parágrafo acima). Assim como encontro nos meus textos mais antigos. É assim que é. O escritor não é um ser perfeito; muito longe disso. Perfeito é ganhar na loteria, torrar tudo em um ano e morrer com a cara cheia de farinha. Perfeita é cerveja gelada em copo de vinho. Gostosas de bundinha pra cima se bronzeando na praia são perfeitas. Comida nordestina é perfeita. A natureza é perfeita. Obviamente, também fui influenciado pelos escritores que não gosto; direta ou indiretamente. Dostoievsky, por exemplo, me ensinou como enrolar pra cacete nos diálogos, quando não sei mais o que dizer. E que o leitor tende a confundir quantidade com qualidade. E que quanto mais algo estiver longe da realidade, ou quanto mais incompreensível for, mais neguinho joga confete. Genet escrevia para o próprio rabo. Nossa Senhora das Flores parece ter sido escrito por alguém com sérios problemas mentais; com retardo mental. Poetas que só escrevem poesia não são escritores. São apenas poetas (por isso não citei nenhum). E o mundo está cheio deles; alguns interessantes, mas a maioria apenas um grande desperdício de matéria humana. Chuck Paliaquem? Os outros não gostam de me ouvir dizer o que penso. Acham que eu tenho que gostar de porcaria só porque o cara morreu em cima de uma poça de água de chuva e foi consagrado pela crítica. Dá licença, né. É exatamente por causa da chatice dos imortais que a maioria das pessoas prefere ler o caderno de esportes do jornal de anteontem. O fato de um cara se forçar a gostar de literatura imortal (ou fingir que gosta) não quer dizer que ele seja melhor do que ninguém; muito pelo contrário. Ele é só mais uma maria-vai-com-as-outras procurando se enquadrar dentro de um grupinho de idiotas sofríveis. Eu tenho nojo de pseudointelectualzinho de bosta. Um bebê acéfalo com alguns minutos de vida vale mais do que todos eles juntos. Quando a namorada deles precisa ser comida direito ela procura uma outra mulher, está me entendendo? Não é machismo. É figura de linguagem.

Gilberto Sakurai
Enviado por Leones Silva em 03/05/2014
Reeditado em 31/05/2020
Código do texto: T4792970
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