botão, palheta, bola quadrada

Madeira, botão, palheta, bola quadrada

amigos, alegria

As Copas da Fazenda Botafogo

Antes mesmo do "Show das poderosas, a gente já dizia pre-pa-ra!"

Quando eu era criança, não gostava muito de futebol. Porém, a Copa de 94, com jogos todos os dias na tv, conseguiu mudar isso.

Lembro que na época consumi tudo que envolvia Copa do Mundo. Álbum de figurinhas, cards, suplementos especiais nos jornais e o que mais aparecesse. Foi em 94 que me iniciei num dos meus esportes favoritos até hoje: o futebol de mesa, ou para os mais íntimos, o botão. Comecei com os botões de plástico ou acrílico, que eram vendidos em qualquer loja de brinquedos ou banca de jornal, mas depois evoluí para os luxuosos botões galalite, que depois vim a saber que eram conhecidos também como “madrepérola”.

Esses botões eram vendidos no bairro em que eu morava, Fazenda Botafogo, extremo subúrbio do Rio, em algumas papelarias. Lembro até hoje do cheiro de talco dos que chegavam novinhos para venda. As cores e os tamanhos eram variados, mas por lá havia uma predileção pelos menores e que imitavam bandeiras de seleções. Depois de anos percebi que havia pouca lógica nesse favoritismo, visto que com essas peças era mais complicado, por exemplo, acertar a bolinha* partindo de uma certa distância.

*Bolinha quadrada, ou um cubinho, vale ressaltar. O sonho do Quico.

Curiosamente, depois de um tempo, os botões pararam de ser vendidos pelas redondezas. Também, convenhamos, tratava-se da Fazenda Botafogo/Coelho Neto/Acari. Havia até a lenda de que a única fábrica de botões do mundo ficava na cidade de Campos (?). Assim, para adquirir novos jogadores, recorríamos uns aos outros, trocando, comprando, apostando... a janela de transferências bastante movimentada.

Os campeonatos que organizávamos também, Como era um conjunto residencial, eram inúmeros os prédios de 40 moradores cada com meninos praticantes do esporte. A audiência das mesas de botão era maior até que a do Super Nintendo, muitas vezes, que já contava com um ótimo jogo de futebol para os padrões da época: o International Superstar Soccer, de Allejo e cia, mas isso é assunto para um outro texto. Lembremos que na época só existia o PS1 entre os consoles mais evoluídos. Voltando aos campeonatos...

Meu prédio, o Edifício Progresso, número 70, contava com inúmeros jogadores: Eu, Leo, Dedé, Jr, Bruno, Daiane – futebol de botão não era só para homem! – e Igor. Tínhamos várias estádios equipes competitivas e regras próprias que se distinguiam das empregadas no prédio vizinho, o 40, que contava com o exímio jogador Leandro. Regras essas que eram diferentes também daquelas do prédio em que minha avó morava, onde também existiam botonistas. Muitas vezes, usávamos o desconhecimento de alguns a nosso favor: uma pequena falha podia resultar num pênalti, por exemplo.

Às vezes, as partidas terminavam quando alguém marcava 3 gols. Ou 5. Ou 10. Ou até cansar. Quando alguém tinha um relógio com cronômetro, era Padrão Fifa. Pena que não tínhamos um tira-teima, porque costumava dar cada confusão...

Os botões merecem um parágrafo à parte. Eram tratados como cavalo de corrida, tal qual cão com pedigree. Talco, parafina e polidor de móveis eram usados para que deslizassem mais pelas mesas. Recebiam nomes pomposos, como Ronaldinho, Kanuh, Etcheverry... todos craques do futebol internacional. Pura humildade. Lembro de acordar no meio da madrugada por sonhar que um botão meu havia sido roubado. Meus pais relatam que eu falava dormindo parecendo discutir com amigos sobre lances polêmicos durante jogos em sonhos.

Lembro de um campeonato que organizamos certa vez com 12 meninos. Récorde de participantes. A premiação consistia em alguns botões vagabundos, duas pipas, um peão, algumas figurinhas e um sacolé. Fui eliminado na primeira fase, mas fiquei para assistir à final. Nem lembro quem venceu. Mas a alegria de estar com os amigos, a alegria da infância, do início de adolescência... isso não dá para esquecer.