O passageiro

A chuva miúda apertava enquanto os passageiros, rapidamente, entravam no ônibus, passando pela roleta, sistema medieval em comparação com a tecnologia dos dias atuais. Junto aos senhores e senhoras bem arrumados que iam para o trabalho, estava aquele homem sujo, de olhos vermelhos, cabelos desgrenhados e pés descalços. Usava uma camiseta que, um dia, fora branca e limpa, com uma palavra escrita nas costas: SUCESSO, talvez propaganda de alguma marca de cigarro ou de refrigerante. Esperou que todos embarcassem e, só então, entrou. Ficou parado na parte traseira do veículo por alguns minutos e resolveu passar pela roleta. Não sei se tinha dinheiro para pagar a passagem ou se alguém a pagou por ele. Foi caminhando, procurando onde sentar-se. Quase todos os bancos estavam ocupados por uma só pessoa que, como eu, gosta de viajar no canto, para melhor apreciar a paisagem ou para não ser incomodada pelos passantes com suas bolsas e pacotes. Ele caminhava como se procurasse alguém semelhante a ele – sujo e maltrapilho – e, não encontrando, sentou-se ao lado de uma negra, realmente a que parecia mais humilde. A mulher o olhou com desagrado e encolheu-se no canto. Talvez tenha pensado em se levantar, mas teve medo de ofender o pobre homem. Logo vagou um banco de um só lugar e ele mudou-se, apressadamente, para esse lugar, onde não incomodaria ninguém. O que teria levado aquele homem àquela situação? Talvez a perda do emprego. Sem emprego ficou sem dinheiro para pagar o aluguel e perdeu a casa. Sem casa passou a morar na rua. Na rua ficou sujo e inspirou repugnância, desprezo, piedade. Sentindo-se sozinho no mundo teve medo. O medo o levou a beber para esquecer-se de que, um dia, foi um ser humano que, mesmo dentro de uma vida pobre, era respeitado. Se ninguém o ajudar ele não poderá se levantar e não voltará a ser chamado de ser humano.
edina bravo
Enviado por edina bravo em 17/06/2014
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