A moça

Uma moça se destacava na rodoviária de Peruíbe. Não era bela e nem vistosa pelas vestimentas que lhe cobriam o corpo, pois o que vestia eram restos do pouco que tinha: uma saia rosa curta sobre uma saia longa de cor rosa mais forte, ambas franzidas dando amplitude à roda da saia. O que intrigava ao olhar aquela moça era a força interior que emanava, involuntariamente, de sua pessoa. Olhei algumas vezes para ela, pois me fazia uma pergunta: _ Onde a vi? Então me lembrei do dia exato em que a vi. Ela descera do ônibus, seguida por seu marido que trazia um cachorro vira lata enrolado num cobertor Paraíba vermelho. Lá embaixo o marido depositara o cachorro no seu colo, abrira o bagageiro do ônibus e de lá tirara uma mochila rasgada, vários colchonetes sem capa e muito velhos, todos enrolados e amarrados pelo meio. À volta, era possível observar os rostos: uns olhavam atônitos, outros com meio sorriso, outros confusos, mas a moça se levantara e fora ajudar o marido e o fizera com pose de rainha, como se de lá tirasse os melhores pertences. Uma firmeza de caráter, uma força interior, uma alegria sem fingimentos e eu abrira a janela do ônibus o mais que pudera. Era uma imagem linda de ver. Como ter tanta dignidade diante de coisa tão indigna aos olhos de tantos? Fôra para casa intrigada e agora revia a moça na rodoviária de Peruíbe.
Ela estava inquieta andando de lá para cá e uma sombra de preocupação marcava seu rosto.
Esqueci a história e a moça, me distraí com outras coisas, pois a rodoviária estava impregnada de ações humanas: estava apinhada de gente.
De repente, alguém chega muito perto e quando me voltei lá estava a moça. Ela me pediu um real para que ela e o marido pudessem viajar para Itariri. Abri a bolsa e comecei a procurar um real, mas de repente resolvi lhe dar cinco reais e bastou para lhe tirar um grande sorriso. Chamou o marido e cheia de vida disse-lhe: _ “Vamo compra a passage!” O ônibus chegou e quando eu estava prestes a entrar a moça chegou com as passagens na mão direita: “Compremo a passage! Para as cinco.” Era o ônibus no qual eu embarcaria rumo à minha cidade. No ônibus guardou suas velhas tralhas conhecidas menos o cachorro. As mesmas caras observando-lhe a ação, o mesmo jeito digno de lidar com toda aquela situação. O sorriso e a alegria eram maiores e me senti como alguém que acabara de comprar o sorriso mais bonito.
Chegando a Itariri, a moça desceu e me desejou boa sorte. Abri a janela e sorri ao ver toda a cena se repetindo: bagageiro aberto, tralhas saindo pelas mãos do casal, rostos vestidos de sentimentos diversos e a moça com o rosto vendendo alegria.
Vendo a cena pela terceira vez quase a chamei para perto da janela para “profetizar” o que minha cabeça gritava: Quem pode ser feliz com tão pouco, traz um prenúncio de um futuro de boa sorte.

Ruth Santos