Som Na Caixa - EC


A primeira vez que ouvi um dos sons mais bonitos da minha vida, foi em 1970. Era um som misturado. Alto. Parecia o som de um imenso mar em agitação ou tempestade. Esse som se revelou num lindo choro em março do ano seguinte. A caixinha de som era tão pequenina, tão forte que enchia a sala, o quarto, a casa. Aquele era o autêntico som na caixa pulmonar. Eita, caixinha boa!

Quando a tiraram do seu mundo acolhedor, sereno, perfeito, ela colocou seu “som na caixa”. Protestou, chorando muito alto, tão alto que nem precisou levar o famoso tapinha no bumbuzinho. Que dó! Mas foi feliz seu nascimento pois foi recebido ao som de música, pois choro de bebê é música quando se sabe que não é de doença, de algo grave, de algo que o magoe.

Depois voltei a escutar o mesmo som em 73, dois anos depois. As mesmas características de movimentação, de natação... Uma beleza sem nome! Mas para ter som na caixa ao sair do seu santuário precisou levar um tapa no bumbunzão. Coitada! Primeiro contato com a gente e recebe um belo tapa! Mas ela estava é com dedão na boca disposta a não deixá-lo sair de lá. Ao receber o tapa o som saiu da caixa com tudo. Talvez pelo tapa foi a criança mais chorona. Chorava pelo pai, pelo "bitô", pelos avós que se iam para suas casas. A gente tentava desligar aquela incrível máquina de som. Só desligava quando ela mesmo queria. Incrível! Eu nunca sabia o que a fazia chorar tanto. Era grande o elenco de motivações para essa caixa de som funcionar tão bem!

De novo em 74 o som de mar e, a movimentação oceânica foi intensa. Esse era mal educado. Como me chutava, Santo Deus! Minha barriga se transformava completamente pelo desassossego do peixinho nadador. No dia de seu nascimento eu levei um susto. Foi o único dia em que estava calmo. Tão calmo que não percebi  que estava para nascer. Agarrei a grade cama e fiquei apavorada de eu mesma soltar o “som da caixa”. Eu não estava só no quarto. Uma companheira, na última hora passou mal com eclânpsia e eu fiquei quietinha para não atrapalhar as enfermeiras que cuidavam da mulher. Cuidados efetuados, passaram seus olhares para mim, pois acharam que estava assustada e não era muito bom. “Minha nossa, o nenê está “coroando”! Vamos pra sala! Ai...Ai...Ai! Foi aí que a caixa de som funcionou a todo vapor. Depois fiquei com vergonha, claro, mas na hora eu queria som na caixa. Era o que me aliviava. Mas o danado não queria som. Saiu de lá com os olhos fechados, dormindo? Não sei. Só sei que pra ele chorar tiveram de bater no bumbum. Aí... Que caixa forte, meu Deus! Que felicidade ouvir aquele som! Mas só produzia som, se estava com fome ou molhado – não havia fralda descartável, ainda. A caixa  de som funciona a todo vapor até hoje. De vez em quando apresenta chiados por causa do cigarro, mas...

Em 76 novamente a sensação de movimentação no meu corpo, as ondulações , as convulsões provocadas pelo movimento rápido e forte... Nasceu mais um sonorista no planeta. Aquele sabia fazer som! Nasceu chorando, tão forte que todos se espantaram! “ Que caixinha sonora ele tem!” Você produziu uma excelente caixa de som!” E sempre que colocava som na caixa quase nos deixava tontos! Era o som da alegria, da felicidade. Até hoje seus sons são de paz, de concórdia, de moderação, de ponderação. O mais estimado no bairro pela espontaneidade, simplicidade, envolvimento com todos.

Depois vieram outros que puseram som na caixa: os netos. Todas as caixas com extensão sonora de alta qualidade. Correm pra lá, pra cá. O caçula só está bem se corre e grita, apita, sei lá o que é que ele faz, mas não para. Só quando dorme.

E seria tão maravilhoso que ninguém calasse esse SOM DA CAIXA dos bebês. Que os deixassem, todos, colocarem seus sons na caixa da vida doada pelo Criador.
Deus proteja os sonoristas com seus SONS maravilhosos NA CAIXA.


Este texto faz parte do Exercício Criativo Som na Caixa
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MVA
Enviado por MVA em 28/07/2014
Reeditado em 19/05/2015
Código do texto: T4899672
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