De Casa em Casa

Foi mais ou menos aos quatro anos que ela foi morar com a madrinha. Um belo dia, não sei exatamente a que tempo, a madrinha fez a malinha dela e a levou de volta para a casa da avó. A madrinha ficou estressada demais. A menininha era levada mesmo e atordoou a madrinha com as suas malcriações, desobediências e travessuras.

A tal ponto chegou que já não se sustentava mais a situação e resolveu devolve-la à família. E assim, lá foi a pequena para o primeiro embate com a vida. Ainda não tinha nem sete anos de idade. Primeiro sofrimento, primeira decepção. Bem já se via que a menininha era danada, de personalidade forte.

E assim foi conviver novamente com a molecada, os primos. Voltou a viver naquela atmosfera gostosa que era a casa da avó e ter com a madrinha a mesma relação de antes. As mesmas esperas, os mesmos sonhos, as mesmas conversas nas tardes dos domingos em que ela ia visitar a família. Aquelas conversas vespertinas tiveram uma grande influência na formação da personalidade dela. De certa forma uma influência positiva. De tanto ouvir, assimilou que era uma pessoinha especial, inteligente, querida, e não se deixou formar por menos. Ou, pelo menos tentou não se deixar formar por menos. Na casa da avó, continuou a sua vida de menina levada.

Num belo dia, queria fazer uma limonada com os limões que apanhara lá no limoeiro do quintal.

Procura que procura o açúcar e nada. Resolveu que ia procurar em cima do guarda roupa.

- Que menina!

Subiu no pé da cama e começou a escalar o guarda roupa pela porta.

- Isso pode não terminar bem!

- Claro! O guarda roupa veio abaixo e não se sabe como, saiu dessa com vida. Era um guarda roupa antigo, pesado, quando desceu ficou apoiado na porta aberta, que soltara a dobradiça debaixo, e no pé da cama.

- Que sorte, a cama também era resistente!

E ela lá, no meio entre o chão e o guarda roupa. No no momento em que caiu, um estrondo, o susto e a correria de sempre.

Adultos, num momento como esse, tem reações contraditórias. Uns choram outros riem, uns não sabem se olham a criança ou a travessura aprontada pela criança, e assim se abraçam ou se batem. Muitos tão nervosos, chegam a bater mesmo.

- Como foi aprontar uma situação dessas! Depois choram arrependidos. Mas, menina levada não para.

Noutro dia, foi no armário da avó pegar um copo. O armário era daqueles antigos com vidro na parte de cima, que o pessoal chamava de "guarda-comida", mas que na verdade guardava-se mesmo era louças e panelas.

Sabe-se lá onde se pendurou a menina que o armário veio abaixo e quebrou toda a louça da avó. Copos, xicaras, pratos, e tudo o mis que estivesse lá. E aí já sabe: o corre-corre de sempre, a bronca, a contagem do prejuízo. E a menina lá com aquela cara de "tudo acontece comigo".

Nem sete anos ainda e já tinha vivido: com a mãe, com a vó,

com a madrinha e com a vó novamente. Já era uma menininha experiente, fazendo dribles pela vida afora.