VAGALUMES NO VIDRO
 
     A noite descia sobre a terra e a envolvia de uma escuridão repleta de lumes em seu véu... No quintal da casinha, a quietude das árvores, o fechar das flores e o calar dos pássaros expressava que a natureza parecia dormir serena e lânguida. Mas os lumes no escuro do céu (as estrelas e a lua) não estavam sozinhos. Na escuridão do quintal por entre árvores, matos e flores, pequenos pontos luminosos de esperança surgiam, pouco a pouco, e voavam de um lado a outro numa espécie de dança cheia de leveza, brilho e magia. Eram os pequeninos vagalumes...
     E nós, crianças que éramos, ficávamos loucas para pegar delicadamente um, para termos aquela luz em nossas mãos...
     Uma noite, pensando nos deixar alegre, um adulto da casa pegou um vagalume e o colocou num vidro transparente e o fechou, deixando furinhos para ele respirar. Também fechou as luzes da casa para que apreciássemos o brilho daquele incrível inseto. E sua luz ia iluminando nossas mãos, rostos e aquele quarto escuro... Foi uma alegria só. Um encantamento! Aquela luz somente nossa.
     Mas pouco a pouco o pobre inseto preso e sem encontrar saída foi perdendo sua luz e suas forças já não o conseguiam manter iluminado. Corremos a acender as luzes da casa para ver o que ocorria e percebemos que o vaga-lume desfalecia. Abrimos rapidamente o vidro e o libertamos novamente em meio as folhagens do quintal. E depois de algum tempo lá estava ele de novo, voando e brilhando feliz, bem longe de nós.
     Hoje observando os acontecimentos da vida que envolvem todos os seres humanos percebo que muitas vezes nos sentimos como aquele vagalume preso naquele vidro. Muitas vezes somos presos ou nos deixamos prender a coisas, pessoas, vícios ou situações. Tais contextos vão nos tirando e destruindo, aos poucos, o brilho da alegria dos nossos olhos, a luz de esperança e fé da nossa alma . E assim vamos perdendo nossas forças, nos reduzindo a apenas nos manter vivos e inertes, sem esperança para encontrar a saída antes que seja tarde demais. E muitos não o conseguem, permitem-se prender, outros se sentem seguros presos, se deixam dominar e estrangular seus sonhos, pelos ciúmes, possessões, orgulho, vaidade, ambição, humilhações e tantos outros vidros que existem nesse mundo.
     Nunca devemos nos deixar prender por vidro algum, por mais bonito e seguro que possa parecer. Prender-se ou deixar-se prender nunca é bom, pois nos limita e conduz ao mesmo destino daquele pobre vagalume, caso não lhe fosse aberto o vidro: a perda do brilho próprio, a morte do seu eu e o seu descartar no lixo.
     Nunca deixemos destruir o brilho que existe dentro de nós, nem nos deixemos morrer por dentro e sermos lançado nas valas do medo, da solidão, da insegurança, do desespero e da tristeza. Devemos, sempre, brilhar livres e alegres ao sabor da brisa do nosso destino e a procura dos nossos sonhos por entre as árvores, flores e matas do caminho da vida, até encontrá-los. Brilhemos vagalumes todos, na escuridão de valores desse mundo que precisa da nossa luz. Quebremos todos os vidros que nos aprisionam e voemos para longe das mãos caçadoras. Brilhemos, brilhemos sempre dando o melhor de nós e voemos à conquista dos sonhos que deixamos para trás tão distantes.
Marta Cosmo
Professora, Artista e Escritora.
-----------------------------------------------
Imagem: http://acordacordel.blogspot.com.br/2011/08/um-belo-soneto.html