Machista sem noção

Voltei, após anos de uma separação sem sentido, voltei. Você até pode não estar disposta a me receber, afinal fui cruel com você por muito tempo, e põe cruel nisso.

Porém, estou de volta, claro que você não sabe disso, pois não liguei e nem avisei de minha volta.

Mas não tenho dúvida que irá me aceitar, pois boa como você é, deve ter esquecido tudo que lhe fiz, das surras homéricas, do pouco caso, das traições à luz do dia e da noite, das incontáveis bebedeiras, do desprezo total.

Ainda assim decidi lhe fazer uma surpresa e aparecer do nada, sem aviso, e se gostaria de me ter de volta.

A minha volta, entretanto, não tem haver com uma mudança em minha vida, não, continuo o mesmo sacropanta de sempre, o mesmo machista violento contumaz, o bêbado e mulherengo de sempre, ainda assim tenho a certeza de que ela me receberá de braços abertos, afinal você sempre foi muito boa.

Toco a campainha e ela aparece diferente, bonita, bem cuidada, estranho aquilo, mas vem em minha direção, e só me reconhece quando chega perto.

Quando se aproxima do portão lhe digo que voltei, e no mesmo instante do seu silêncio sepulcral uma voz vem lá do fundo como um trovão: “Quem é amor”. E ela responde: ninguém, um bêbado andarilho sem noção, mas já foi embora.