Neném na caixa de papelão
Chama-se Aurora, como poderia se chamar Vitória, ou outro nome bastante simbólico que costuma ser dado nestas ocasiões. Aurora pesa pouco mais de três quilos e mede 47 centímetros – cabe perfeitamente dentro de uma caixa de papelão. Coberta por um pano, ninguém imagina que está lá dentro. Quem sabe seja um gatinho, pensa o estudante que passa pela rua e encontra a caixa. Mas um braço se deixa mostrar – é o bracinho de Aurora. E o estudante descobre um bebê, um recém-nascido ainda com cordão umbilical.
Ora, o estudante é apenas um estudante de 20 anos, não tem os próprios filhos, não tem experiência de vida, e por isso não sabe exatamente o que fazer com aquela criança que ele pensou que fosse um gatinho. Mas há por perto uma mulher, uma mãe, alguém que leva Aurora para casa, coloca roupinhas novas nela e em seguida acompanha o estudante até uma delegacia. De lá parte uma viatura dos bombeiros e a recém-nascida é levada de volta para um hospital, onde é submetida a uma série de exames e recebe o seu nome de batismo.
Que, deixe-se claro, não é o mesmo escolhido pelo estudante. Para ele, a menina se chamaria Karen – o estudante queria fazer algum tipo de homenagem ao pai, que é de origem austríaca (o estudante não sabe que Karen é de origem escandinava). Mas Karen não é um nome que se dê a um neném encontrado em uma caixa de papelão, por mais que signifique “pura” ou “casta” – é muito mais adequado chamá-lo de Aurora. E, também, o estudante foi apenas a pessoa que encontrou a menina, não pode sair batizando assim quem bem entender. Que faça a homenagem em sua própria filha, parece dizer o hospital.
Não é todo dia que se encontra um recém-nascido, e por isso o estudante nem sabe o que dizer quando perguntam como se sente. Tem apenas uma convicção: a de que é preciso manter contato com Aurora depois de tudo isso. No abandono daquela criança, não desejada, não programada, um rapazinho descobriu os seus próprios desejos de pai.