QUE SE DANE A MARTA SUPLICY

Vi em um videocast no Youtube um depoimento que analisava um posicionamento da deputada Marta Suplicy com relação à sua eterna bandeira política que procura defender a classe gay em detrimento à classe evangélica. A crítica no videocast se referia a uma frase que a sexóloga teria pronunciado, "Não se deve falar mau de classe nenhuma fora do seu templo". Na cabeça dela, se um pregador acha que união entre iguais é sem-vergonhice, ele só poderia falar isso para os seus fiéis em seu recinto e o mesmo valendo para estes. Como na casa de cada um de nós se diz o que se bem entender a respeito de qualquer assunto, esse tipo de restrição penso que a deputada não tenha cogitado fazer. Logo, em casa não tem problema não satisfazer a vontade da loura, não atendendo encarecidamente o apelo dela, que não acrescenta em nada para melhoria da sociedade ou em favor da soberania brasileira, e continuar chamando homossexual assim em vez de homoafetivo. Ela que se sinta bastante feliz, pois a palavra homoafetivo não foi riscada de vermelho. Nota-se que o corretor ortográfico on line já aderiu a regra. Se isso consola!

Bem. se todos formos respeitar a regra, significa que na rua ou em repartições públicas teremos que evitar mencionar alguém do grupo defendido para não haver problemas com a majestosa e funcional Lei Brasileira. Só que os homoafetivos (sem sarcasmo) não devem sair da linha também, terão que chamar negro de afrodescendente (não riscou de vermelho também), drogado de dependente químico e prostituta de profissional de sexo. E com o devido respeito. Sem aquele sorrisinho maroto seguido de trancamento de dentes que faz falar a pronúncia desejada bem baixinho e para dentro como se fosse um ventríloquo.

Agora, isso não se limita a quem sai na rua ou a quem vai em bares e restaurantes não. As ondas eletrônicas da televisão entram em nossa casa sem a nossa permissão. Mesmo se não tivermos aparelho televisor jazendo em cima de uma estante na sala ainda assim elas entram. A casa da gente é ambiente privado, mas quem vem pelo ar, desce pela antena e desbanca a falar se encontrar o aparelho ligado e sintonizado na estação é palestrante público. Tanto é que os telespectadores são chamados de público de televisão. As produções televisivas também têm a obrigação de serem comedidas para cumprir. Elas não podem ofender nem pejorativamente, com termos depreciativos dirigidos a determinado grupo, e nem expondo ou criticando alguma prática que seja comum a líderes ou membros deste. Não podemos esquecer que sugerir uma conduta ou uma reflexão a respeito de algum hábito, moral ou ética é intolerância também. Se uma pessoa se sente muito bem vestindo amarelo e rosa ao ir em festas de casamento, ela não tem que tomar um choque de desapontamento por ser chamada de brega na televisão não. Nem direta e nem subliminarmente.

Aí você me diz, tomando as dores das emissoras e sentindo peninha das coitadas: "Mas as emissoras já fazem isso, já conservam essa gentileza". Só me resta, então, provar para você que não.

Na última segunda-feira inaugurou-se uma novela das seis na Globo. Eu não via um capítulo de telenovela até então, havia dois anos. Mas por algumas razões, entre elas arrumar o que colocar em minha fan page retrô no Facebook, Os Meninos da Rua Albatroz, assisti três vezes nessa semana que terminou ontem. No primeiro dos capítulos que vi, uma noiva deixada no altar dizia para o padre "Você nunca amou não, padre? Nunca quis acordar com alguém do seu lado?" e para a imagem de Nosso Senhor Jesus Cristo: "E você, por que me odeia tanto? Tinha que levar meu noivo hoje? No dia do meu casamento?" ou algo assim. Fica parecendo que a emissora ou quem pagou pela cena quis que o público tivesse essa reflexão, quis que debochasse disso ou quis dizer o que gostaria de dizer para padres e a comunidade católica, livre e desimpedido como sempre foi. Essas táticas estão no ar faz tempo. Sem censura. E com aprovação de todas as classes. E sem estar em seu templo. Estava dentro da casa de todos nós. Sem a permissão de quem é da casa e assiste ou não telenovelas. E a Suplicy já trabalhou naquela emissora, hein! Quem será que pagou pela cena, hein? Foi ataque ou não foi? Padres serem celibatários é um fato milenar, faz parte da profissão. Se a instituição ou a comunidade não quiserem mais que seja assim isso deve ser discutido entre eles. A mesma coisa vale para o dízimo que o evangélico paga e que o pastor cobra. Eu tenho minha opinião para os dois casos, mas aqui não é um templo, já que é assim!

Em outro capítulo, um menino se indignava porque a Argentina vencera os peruanos por 6 a 0 na Copa, com certeza a de 1978, e foi parar na Final. Isso, subliminarmente, conduz as pessoas a alavancarem ou a manterem acesos um ódio pelos hermanos. Vale lembrar que esse suposto ódio que se sente hoje (eu tô fora) iniciou-se a partir da Copa seguinte, exatamente por causa do jogo mencionado na cena, que muitos julgam ter sido trapaceado. Até o Argentina X Holanda só sentimos um certo pesar de termos ficado de fora. E foi a imprensa que criou e que sustenta esse ódio porque ele é lucrativo. E eu não ganho nada com isso, então, na minha casa eu não quero novelinhas incitando rancor e desprezo contra os amigos argentinos que tenho. Nela eu quero que vigore a paz entre os povos. E sem a hipocrisia daqueles que ficam dizendo que também são amantes disso, que pregam isso, e na primeira oportunidade mostram o contrário. Tá aí mais uma invasão de privacidade para tentar colocar ideias ou termos pejorativos na cabeça de alguém.

Agora, o mais descabido foi o terceiro dos três capítulos assistidos. Uma garotinha, talvez de quinze anos ou menos, extorque dinheiro de um garotinho, de um pouco mais de idade do que ela, ameaçando contar para a amiga dela, que havia ido até a cozinha da casa onde mora para buscar uma xícara de açúcar para entregar para a extorquidora á porta da sala, que o garotinho é apaixonado por ela. Parece ingênuo, né? Um monte de gente deve ter dado rios de gargalhada por causa da astúcia da garotinha e do sufoco que passou o menino. Que mal pode ter numa cena dessa, né? Pois, sim, tem é muito mal. Porque implicitamente a obra dramatúrgica está ensinando os que a assistem a conseguir as coisas por meio de ameaça. "Você sabe alguma coisa recôndita sobre alguém, use para conseguir benefícios", esta é a mensagem. Mais tarde, os pirralhos vão querer usar o que aprenderam para conseguir benefícios nada ingênuos. Vão dizer: "Se você não votar em mim para eu arrumar três milhões do dinheiro público para o desfile do estilista Pedro Lourenço, vai perder seu Bolsa Família". E ninguém poderá reclamar se tratarmos isso como banalidade e não tivermos no Congresso Nacional políticos atentos e íntegros nos representando em causas que realmente trazem ganho para a sociedade. Como, no exemplo, disciplinar as transmissões televisivas. E os abusos ao destinar o dinheiro público, né?