A Mulher Desamada

Na análise sob o enfoque sentimental do terceiro tipo de mulher, a responsabilidade pela situação , de forma direta, não é do homem, mas desloca-se para ela própria.

A exceção está nas hipóteses de abandono por motivos vários ou substituição por outra. Neste caso, o abandono determina apenas o fim de uma fase e o marco inicial de uma nova.

O relacionamento já está deteriorado, o desamor toma todos os espaços, o diálogo cordato transforma-se em discussões acaloradas. Não há mais respeito, as agressões verbais ( às vezes físicas) tornam-se uma constante nas suas vidas.

Esses momentos são alternados com conversas sobre assuntos supérfluos, apenas para quebrar o gelo, e não ficarem emudecidos diante um do outro.

Os olhares mal se cruzam, ante o receio de denunciarem o vazio de suas vidas neles estampado.

Há uma distância abismal entre ambos. Os filhos, se os têm, constituem o único resquício, um mero fragmento de um ato mecânico ou mesmo de amor, perdido num torvelinho de frustrações em que se transformara a convivência, com o passar dos anos.

Nessa tipologia de mulher, o fator idade não tem a mesma importância que nas hipóteses anteriores.

Há mulheres mal amadas na juventude, na faixa intermediária e na maturidade. O problema é mais pessoal do que dependente de terceiros. Mas cada caso é um caso.

De modo geral, ela tem a estrutura existencial debilitada, quer pela solidão, quer por alguma trauma de situação mal resolvida, quer por reclusão voluntária, temor ou falta de aptidão para estabelecer um relacionamento.

Em muitos casos, chega a esse ponto por um erro de perspectiva do futuro ou por temor de uma aventura mal sucedida. Também, por aspirar a conquista somente pessoas de certa posição econômica que lhe acenem segurança no futuro.

Em último caso, por inibição, mesmo. Por faltar-lhe um pouco de agressividade, necessária a toda conquista, seja no campo amoroso, no campo profissional, ou em outro qualquer.

A situação está bem posta por Chico Buarque de Holanda, numa das pérolas do nosso cancioneiro popular, quando “o tempo passou na janela e só Carolina não viu”.

Pois é, com a nossa Carolina ocorre o mesmo. Ao descobrir tardiamente a perda dos anos, sendo impossível a reversão do tempo, torna-se muito vulnerável. A sede de recuperar o tempo perdido leva-a a baixar a guarda, a esquecer todas as regras de defesa empregadas até então.

Torna-se, em tese, presa fácil para uma cantada bem dada.

Ainda pode ocorrer o pior. A repressão sexual de toda uma vida de recato e resignação, mais do que a carência afetiva, transmuda seu comportamento e elege o sexo como fator mais importante.

Nesse passo, a escolha pode recair em candidato jovem, pleno de fogo e de tesão, mas sem as intenções que ela sempre desejou, mas, por preciosismo, orgulho ou esnobação a rejeitou.

A decepção recolhe-a novamente ao seu mundo fechado, ou a remete a situações indesejáveis, nunca dantes imaginadas, como a bebida, o tabagismo ou até a mudança de preferência sexual.

Esse quadro pintado. Essas situações descritas não são infalíveis, mas constituem uma análise média das observadas ao longo dos anos, no contato direto ou ao longe, no círculo de amizade ou não.

A mulher desamada não merece compaixão e sim, lamento.

Lamento porque os efeitos da perda do tempo somente surgem na maturidade, quando fases importantes da vida não foram aproveitadas, nos momentos mais gratificantes.

Lamento porque a fase áurea da mulher, sob o ponto de vista de amadurecimento pessoal e sexual, que se inicia por volta dos trinta e cinco anos, foi desviada para objetivos outros em proveito de terceiros, sejam filhos, marido, companheiro ou parentes.

Lamento, ainda, porque a doce ilusão de perenidade do relacionamento, em um lapso, como castelo de areia construído na praia, restou desfeita, a onda levou.

Biuza
Enviado por Biuza em 21/05/2007
Código do texto: T496078