NUNCA PERCA A ESPERANÇA

Vivi uma boa parte da minha vida, na região do Mercado Municipal de Taubaté. Ali ganhei muito dinheiro, e muito dinheiro perdi.

Lembro-me que quando tinha mais ou menos nove ou 10 anos eu ia com a minha mãe ao mercado, para carregar a cesta de vime, onde era guardado tudo que ali ela comprava. Isto era feito no sábado. No domingo, eu aproveitava para ganhar algum dinheiro, carregando cestas para senhoras de mais idade, que não podiam fazer aquele esforço físico.

Já com meus doze anos, fui trabalhar com o meu irmão Claudio, vendendo frutas e verduras em uma barraca para este fim. Com a ajuda do meu pai, ele comprou um Armazem, e eu fui ser seu auxiliar. O negócio não deu certo, e logo ele foi a falência.

O mercado, todo e qualquer mercado, seja em que cidade for, tem um cheiro característico. Ele impregna nossas narinas de tal maneira que nunca mais a gente se esquece daquele cheiro, e o que é pior viciamos, e nunca mais queremos deixar de frequentá-lo

Com 19 anos, eu e meu irmão Mário montamos uma loja de cosméticos e perfumaria no mercado, o local não era muito bom. Mário, arrumou um emprego como representante de livros, e isso lhe dava um rendimento melhor, e eu fiquei sozinho.

Meu pai, apesar de duro com os filhos, tinha um amor especial por todos nós. Um dia ele foi até a minha pequena loja, eu ficava sentado em um banco de madeira, esperando algum cliente entrar.

--- oi filho. Como estão as vendas?

--- vamos indo pai, o ponto é ruim, mas estou sobrevivendo.

--- então... eu vim aqui lhe pedir um favor.

Meu pai nunca pedia favores a ninguém.

--- pode pedir pai, se eu puder claro que eu quero ajudar.

--- na verdade o favor não é para o seu pai, e sim para um irmão seu.

--- qual deles. - sorri.- nós eramos naquela época todos vivos, então perfaziam um total de dez.

--- para o claudemir... ele esta desempregado, saiu agora do exército e precisa arrumar um lugar para trabalhar.

--- sei pai... mas eu mal consigo tirar o meu sustento, como vou poder pagar o Clau. - era assim que eu chamava o meu irmão.

--- não se preocupe, converse com ele, ofereça um salário, e deixa que eu pago, só não quero que ele fique sem trabalhar. Você sabe, é muito inteligente, esperto, mas não quer estudar, pensa somente em futebol.

Claudemir foi um dos melhores jogadores de futebol que eu já vi jogar, o outro irmão que podia ser igual ou melhor que ele era o Clair. Todos os outros eram pernas de pau, inclusive eu.

--- tudo bem pai, se é assim, sem problemas, pode pedir para ele vir a partir de amanhã, e eu explico como tudo funciona.

trabalhamos juntos uma infinidade de anos, não sei dizer quantos, mas foram muitos anos. Ficamos mais do que irmãos, ficamos de raciocínio gêmeos.

Agora que vocês já sabem quem é o Clau, eu vou contar sobre o jogo do bicho.

Depois de alguns anos eu mudei de ramo, e comprei uma loja que vendia, doces, bolachas,biscoito, todo o tipo de guloseima.

Claudemir, continuou no ramo de cosméticos e perfumaria, trabalhando com um outro irmão, hoje falecido. Claudionor.

Um dia porém, o Clau, resolveu criar asas, eu montou uma pequena loja no mesmo ramo no qual ele tinha se tornado um expert.

O comércio em geral ia de mal a pior. época de crise. inflação alta, e todos os comerciantes passavam por uma certa dificuldade.

Estava eu sentado em meu caixa em minha loja, próxima a entrada principal, minha loja tinha três portas.

--- oi claiton, estou precisando de sua ajuda. - disse ele aproximando-se do lado do caixa.

Um caminhão enorme do biscoito Piraquê tinha acabado de chegar, e eu pedi um momento para ele.

--- o momento, já conversamos. - peguei a nota do entregador, e mostrei aonde eu queria que a mercadoria fosse descarregada. Voltei.

--- fala Clau... em que eu posso ajudá-lo.

--- estou precisando de dinheiro, preciso comprar mercadoria, mas só tenho cheques pré-datados, será que você não consegue troca-los para mim.

Olhei com tristeza para o meu irmão preferido.

--- infelizmente eu não posso... a mercadoria que esta chegando tem que ser paga a vista para eu ter direito ao desconto, e já retirei tudo o que tinha. Espero que entenda.

Claudemir fez uma cara de tristeza, eu acho que era sua última opção.

Peguei a nota e li o número 8.899, não sei dizer qual o motivo, mas eu gostei da milhar, virei para o meu irmão e disse.

--- vou jogar no bicho este número e a tarde você vem e eu te empresto o dinheiro. - disse com convicção, porém para ele talvez tenha parecido uma brincadeira.

ele pegou a nota fiscal da minha mão. viu o número. Falou um palavrão, destes cabeludos, olhando bravo em meus olhos.

saiu batendo os pés, talvez indo em busca do dinheiro que eu não pude arrumar em outro lugar.

Neste tempo eu ainda era casado com a Salete, mãe dos meus quatro filhos. Ela tinha acabado de tirar carta, e eu estava pensando dali há alguns meses lhe dar um Fusca de presente, porém, naquele momento isto era impossível.

Meu irmão Claudio, não tinha estudado, acho que no máximo tinha feito o primário. Vivia agora como recolhedor de jogo do bicho, ganhando vinte por cento do total das apostas que arrecadava, como era muito conhecido ali no Mercado, sobrevivia com dificuldades, para tinha a sua profissão liberal.

Fui até o Bar do Zezinho, onde o meu irmão ficava recolhendo as apostas.

--- oi claudio. Quero fazer um jogo, e cercar este número de todos os jeitos. Dei lhe a milhar anotada.

Ele sorriu.

--- este número só vai dar por milagre, não quer apostar em outro, hoje esta bom para Leão.

--- não... eu quero jogar este número.

Claudio sabia tudo de jogo do bicho. Jogou a milhar seca, combinada, duque de dezena, e também as centenas. Não sei quanto joguei, mas foi um valor razoável.

Eu tinha 3 empregados, e a mercadoria que acabara de chegar tinha venda garantida, e logo estava exposta para a venda. O movimento durante o dia foi excelente, e eu nem vi o tempo passar. Almoçava na loja, ou então ia comer alguma coisa no Bar do Zé.

Já passava das 14.45, quando o Claudemir, se aproximou novamente do caixa. Eu percebi que ele estava nervoso, agitado.

--- então... como é... ganhou no bicho, vim pegar o dinheiro. - disse ele descrente.

Eu estava tão entretido com o meu trabalho, que nem tinha visto as horas passarem.

--- nem sei o que deu, vamos lá no Bar o resultado já deve ter saido.

Ele me acompanhou. O claudio, tinha bebido um pouco mais do que devia, e estava recostado em um canto dormindo. Fui até o senhor Zezinho.

--- oi tem o resultado da PT de hoje.

--- tenho. Duvido que alguém tenha ganho, somente o banqueiro com certeza.

O comerciante copiou o número sorteado e deu em minha mão.

Meus olhos se arregalaram. Bati com o punho forte no balcão. Peguei a milhar na cabeça. Gritei.

O claudio acordou. O claudemir pegou o resultado da minha mão.

primeiro premio 8.899

--- puta que pariu claiton, você ganhou uma bolada, milhar na cabeça, combinada, seca, centena, e o duque de dezena.- disse claudio sarando da sua bebedeira.

--- quanto ganhei. perguntei

--- bastante... não sei quanto, mas foi bastante.

voltamos para a loja. eu, o claudemir e agora o claudio.

--- quando recebo.n - perguntei

--- amanhã. vem um cheque do UNIBANCO, pagável em qualquer agencia, vou fazer a conta agora e ver quanto vai dar tudo isso. - claudio apesar de ter pouco estudo, era um exímio fazedor de contas.

Para simplificar a história. Emprestei o dinheiro para o meu irmão. Comprei um fusca vermelho para a Salete, e ainda me sobrou uma quantia satisfatória.

Portanto amigos, nos momentos difíceis da vida, sempre acredite que sua sorte vai chegar.

Dificuldade é apenas um momento passageiro.