O burro do Poli
   A chácara onde mora faz do Poli o vizinho mais próximo do novo cemitério municipal. Na chácara, entre caprinos, eqüinos e aves, Poli tem um burro que atende pelo nome de Alegre. É ele que, do seu posto de trabalho, vela cada campa. É um burro sossegado, mas atento. Não se dá por ele a não ser nos funerais ou nos finados. Chegados ao cemitério, findo o canto fúnebre, o burro do Poli continua a salmodia na sua língua materna. É difícil manter a compostura e guardar a seriedade. O seu dono é o primeiro a desfazer-se em prantos de gargalhada contida. Já o avisei para que guarde o animal a sete chaves quando há funeral, mas o Poli não tá nem aí.  É que ninguém consegue ficar-lhe indiferente numa cerimônia que exige tanto recato. Foi quando o Poli me contou que no último Finados o bom  padre Constantino, para dar início ao ritual das exéquias e celebrar a missa dos fiéis defuntos, no cemitério, dado que os presentes faziam barulho inapropriado, pediu, alto e bom som, que se fizesse silêncio a fim dele prosseguir as orações com a devida dignidade. As pessoas aceitaram o pedido e calaram-se. Nisto, o burro do Poli, quase em tom de gozo com o padre, abriu os beiços e zurrou uma sinfonia de zurros nunca antes ouvida.  Sorriram as pessoas e conformou-se o padre, dizendo. Bem, a este não posso eu mandar calar.