Muito mais que ensinamentos...

Muita gente me pergunta: por que você não está lecionando? A resposta é que eu simplesmente não sei porque. Talvez eu acredite que mereça um descanso de alguns meses após a minha cansativa monografia. E é o que estou fazendo. De resto, não sei mesmo a razão.

Quando eu fiz meus estágios, além de aprender, eu me diverti pra valer. Invariavelmente existia um aluno que surpreendia, e fazia com que eu acreditasse que talvez eu poderia mesmo ter vocação para a coisa. Mas como toda as profissões, nem tudo são flores.

Um dia, aflitos com tanta agitação na aula do primeiro ano do ensino médio, eu e um amigo que estagiava comigo interrogamos alguns alunos. Durante o intervalo fizemos a seguinte pergunta: Como deve ser um professor? Como vocês gostariam que os professores fossem?

Não sabiam explicar direito. Um deles respondeu: "Eu gosto daquele professor que passa a matéria, mas brinca também", o outro disse: "O professor quando é firmeza, todo mundo gosta!", e quando esse último se pronunciou, os outros assentiram imediatamente.

O desafio era entender o que era o "professor firmeza". Eu interpretei como o professor amigo, talvez aquele mais descontraído, que faz piada e no fim da aula está aberto para um diálogo.

Ser amigo dos alunos? Sim, pode até ser. Mas muitas vezes, se a gente dá a mão, eles querem o pé! Prova disso é que alguns alunos conseguiram tirar minha calma diversas vezes, entretanto como uma professora que se preze, fiz de tudo para manter meu equilíbrio e não deixar transparecer nenhuma insegurança. Consegui contornar algumas situações inusitadas, como a vez em que o aluno tirou fotos das minhas costas (bem, não era bem as costas...) utilizando um celular, ou da vez que um outro quase fez a sala pegar fogo com um isqueiro em mãos.

Não sei se fui a mais sensata diante das situações, mas acho que eles não se esqueceram fácil de mim. Eu criei uma tática particular: escapava das situações quase que da mesma forma que eles as criavam. Difícil explicar, mas funcionava, assim como uma espécie de "troco".

Agora, o que jamais vou me esquecer é das salas especiais! Mas que delícia era trabalhar ao lado da intérprete de surdos-mudos. Aqueles rostinhos angelicais de oitava série? Somente ali, naquela sala. A maioria disciplinados e educados. Questionavam os temas, perguntavam, esclareciam dúvidas! Exemplares! Não vou dizer que tudo ali era fácil, três meninas surdas-mudas ficavam fofocando durante a aula! É, não é brincadeira, elas não paravam um minuto! Mas com jeitinho a intérprete pedia a colaboração das meninas que me olhavam de uma forma doce e um sorriso. Essa sala tinha um grande diferencial. Eu não tinha que manter a calma e me desdobrar para a sala se comportar. Eu tinha muitas vezes que ser imparcial e conter minhas emoções.

Depois de uma conversa com a Diretora da Escola, ela me propôs que eu trabalhasse no Projeto Escola da Família aos sábados, como voluntária. Eu topei. Todas as manhãs de sábado eu atendia em particular um aluno especial com dificuldade na lição de casa. E com o tempo, foram surgindo um tanto de coleguismo e amizade. Os mais carentes contavam histórias de vida, davam lições valiosas de amor-próprio e de coragem!

Foi então que eu entendi o que os alunos do primeiro ano queriam dizer sobre o professor ser "firmeza". Ser firmeza era de fato escutar aquilo que eles tinham para falar, mais que isso, era dar apoio e atenção. Era sentir as necessidades de cada um em particular, afinal, cada um tem uma vida, uma história, um problema e uma dificuldade para sanar. Ser firmeza era ser espontâneo e principalmente exercer um papel social de professor confiável.

Flávia Freitas
Enviado por Flávia Freitas em 28/05/2007
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