AMOR PRODUTO X AMOR

Ao quase me amar ele ainda não tinha visto todos os meus cacos, minhas tramoias, meu grito atrasado, minha boca pressionada pra falar, meu calor repentino. Ao quase me amar só tinha construído ideias de mim. -bem normal nos tempos atuais-.

Mas até quando duraria esse projeto? Já sabia que não duraria muito. E se tive um pecado foi de não me expor completamente. Atuar num filme dirigido por ele pra depois abandonar o set de gravação. Algum diretor perdoaria o ator principal, se o mesmo alegasse, que o personagem ganhou vida própria?

-Mas que raios de vida própria? Ninguém aguenta a liberdade do outro, é utópico demais! Adoramos aprisionar. O homem nasceu pra aprisionar; aprisionamos nossos corpos em roupas de segunda mão, nossos dias em escritórios cheios de burocracias inacreditáveis, nossos sonhos malucos em estabilidade financeira, nos poupamos de absolutamente tudo, e pra quê? Para desfrutarmos de uma vida miserável, amedrontada e, profundamente, arrependida. Pra passarmos vinte anos trabalhando oito horas por dia, servindo a um sistema ineficaz e distante de nossas reais necessidades humanas.

Ao quase me amar, ele sequer pensou em meu bem estar, meu histórico de vida, minhas privações ou meus objetivos. Ele quis companhia, me via como um produto que estava acostumado a comprar, se o produto vier com defeito a gente joga fora. Quem tá acostumado a viver imerso em um mundo de consumismo não tá pronto pra amar, não sabe viver com produtos danificados, não gostam de coisas usadas. Mas o amor é antigo, tem lá seus charmes, mas é difícil. Amor é coisa pra gente grande, gente de fibra, porque ele quebra todas as estruturas, rompe velhos conceitos e revigora a alma. Mas essa geração é de crianças consumistas, birrentas e pretensiosas.

Lucas Guilherme Pintto
Enviado por Lucas Guilherme Pintto em 30/11/2014
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