EU, LEITOR

"Graça Infinita", de David Foster Wallace, já está a caminho. Comprei pela internet, parcelado em três vezes. Aproveitei e comprei também "2666", de Roberto Bolaño. Não gosto de comprar livros pela internet, é frio demais. Nunca fiz cadastro em sites de compras; não gosto de comprar – a não ser livros. E livro, para mim, tem que ser em livraria, onde eu entro e me esqueço da vida, tomo café, leio, imagino histórias, viajo no tempo e converso comigo mesmo, sozinho – tem que ser sozinho. Na verdade, quem comprou esses dois livros para mim foi minha mulher. Ela disse que vai me dar de presente. Bom demais!

David Foster Wallace e Roberto Bolaño. Dois grandes escritores. O primeiro, norte-americano, o segundo, chileno. Ambos falecidos. Deixaram muitos escritos, e neles, suas visões de mundo – janelas onde nós, leitores, nos debruçamos para experimentar novas perspectivas, novas sensações, que muitas vezes nos libertam do senso comum e nos mostram outros caminhos, outras possibilidades de ser. É isso que a grande literatura faz comigo.

Há livros que só me tocam na superfície. Eu leio, muitas vezes até me divirto, fico interessado pela história, mas não passa disso, é tudo muito raso. No entanto, há outros que mexem comigo de verdade, que vão fundo, me iluminam, me libertam, me abrem o mundo de um jeito diferente, novo. Através deles vejo coisas que antes eu não via, ou se via, passo a vê-las com outros olhos. Isso me faz muito bem, até quando sofro com a leitura – quando ela dói e sangra –, como quando li "Crime e Castigo" e "O Idiota", de Dostoievski, e "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector. Dor que liberta...

Estou lendo agora James Joyce, "Retrato do artista quando jovem". É a primeira vez que leio esse cara. Grandioso! Experiência fantástica! A sensação é parecida com a que eu tive quando li pela primeira vez "On the road", de Jack Kerouac. Uma prosa que te hipnotiza, que te puxa para dentro, e você vai, deixa-se levar, sem saber o que te espera, e não quer sair. Foi assim também com Louis-Ferdinand Céline, escritor genial, mordaz, inteligente e irônico até não poder mais. Sei que ele apoiou os nazistas e escreveu panfletos antissemitas – o que muito me entristece –, mas isso não aparece em seu livro "Viagem ao fim da noite", de 1932, que é sensacional! – mexeu demais comigo.

Grandes escritores me ajudam a ler o mundo, e a me ler nesse mundo. Não é leitura fácil, porque a gente se analisa muito, se descobre, e descobre as coisas, as pessoas, se engana, escava, vai fundo, se machuca, e por isso não aceita facilmente o que para muita gente é óbvio e natural. Muitas visões e crenças que existem por aí me parecem limitadas, superficiais demais, porque são fechadas, falta-lhes reflexão, abertura para outras possibilidades, outras experiências. É sofrido...

Ultimamente, em minhas leituras, tenho me descoberto acomodado demais ao que é 'óbvio e natural'. Eu sei que assim eu não me realizo, não exploro o que há de melhor em mim, o que eu mais sei e gosto de fazer. Mas tem que ser assim? Não. Posso mudar minha vida, e talvez nem precise ser radicalmente – alguns ajustes de percurso, um desvio aqui, outro ali, quem sabe? Já tenho algumas ideias...

Flávio Marcus da Silva
Enviado por Flávio Marcus da Silva em 07/01/2015
Código do texto: T5093508
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