Um trabalho de História da Arte

Há vinte anos, quando eu cursava o terceiro período de História em Belo Horizonte, fiz um trabalho para a disciplina História da Arte que até hoje me enche de orgulho. Foi um pequeno estudo sobre o cineasta inglês Alfred Hitchcock. Seu título: "Cinema: a arte de Alfred Hitchcock". Na época eu não tinha computador, escrevi tudo à mão e paguei uma pessoa para digitar. Tenho as duas versões aqui comigo, como recordação. Ficou muito bom.

Naquela ocasião, eu já era fã do Hitchcock, tinha assistido a quase todos os seus filmes, alguns mais de uma vez – como "Janela Indiscreta", de 1954, para mim, um dos melhores. Eu adorava o trabalho dele, achava-o genial, incrível, um verdadeiro artista, e ainda acho. Hitchcock morreu em 1980, aos 80 anos, mas continua vivo em sua obra – filmes que, como peças de um grande quebra-cabeça, compõem o quadro de uma vida quase inteira dedicada ao cinema: a obra de um grande artista. Nela o autor se revela – sua visão de mundo, seu estilo, seus medos –; sua assinatura está em cada produção, evidente, como a de um pintor em seus quadros; vemos sua marca inconfundível nos movimentos de câmera, na construção das cenas, no trabalho com os atores, na forma como ele criava o suspense e aterrorizava o espectador.

A ideia que eu defendi no trabalho era a de que Alfred Hitchcock tinha um estilo próprio, original, e que seus filmes levavam a sua assinatura, a sua marca registrada, não sendo, pois, simplesmente, filmes comerciais. A ideia não era original, mas o texto que eu escrevi para defendê-la, sim; a pesquisa bibliográfica, a análise de imagens e filmes, a contextualização histórica, a redação, tudo isso tinha o meu toque, o meu estilo, embora o resultado fosse um texto despretensioso, simples, sem nenhuma repercussão além da boa avaliação feita pela Prof.ª Adalgisa. Para construí-lo, li muito, revi filmes, pensei, argumentei, escrevi, reescrevi, tudo sem computador, sem internet! Li um livro inteiro em dois dias, uma tese do Heitor Capuzzo, que no trabalho eu misturei com Edgar Allan Poe, Agatha Christie e textos sobre violência e criminalidade na Inglaterra do final do século XIX. Deu muito trabalho, mas foi um prazer escrevê-lo; e o melhor de tudo: fiz sozinho, do meu jeito.

Hoje percebo que esse tipo de experiência não é muito comum na Educação Superior, mesmo em cursos da área de Humanas, porque, no geral, os alunos chegam do Ensino Básico sem base, principalmente de leitura e escrita. Cobra-se muito mais memorização e reprodução de informações do que criatividade, análise e argumentação, tanto no Ensino Básico quanto no Superior. Os alunos leem pouco, escrevem mal; há pouca discussão, pouco interesse por leituras longas, com aprofundamento, reflexão. É triste.

Estou agora pensando na famosa cena do chuveiro, do filme "Psicose", de 1960, grande sucesso de Hitchcock. Nela uma mulher é brutalmente assassinada enquanto toma banho num motel de beira de estrada. A cena foi escolhida por críticos franceses como a mais memorável da história do cinema. Filmada em setenta ângulos diferentes durante sete dias, a sequência dura apenas 45 segundos, mas é antológica, perfeita: uma estrutura complexa, mas harmônica, bela. Não é verossímil, mas e daí? É arte... Preciso rever esse filme.

Flávio Marcus da Silva
Enviado por Flávio Marcus da Silva em 16/01/2015
Código do texto: T5103504
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