Sobre o mundo em que vivemos - e como se livrar dele

Todos os dias eu vejo pessoas. Pessoas se preocupando com contas a pagar, roupas a comprar, celulares a atender. Todos os dias eu vejo pessoas correndo contra o tempo, contra si mesmas. Elas talvez mal sabem a direção, mas elas correm. O tempo todo. A aglomeração de pessoas no centro da cidade torna inviável o olhar para o redor. Vozes e mais vozes falando sobre assuntos que, para uns, não fazem sentido ou diferença e que, para muitos, são postos em primeira linha, primeiro plano. Por uma mera oportunidade, escapei da multidão e pude avistar um homem solitário, sentado no meio fio. Ele usava somente um moletom cinza todo sujo, calça rasgada, sandálias arrebentadas e barbas grisalhas. O homem também não estava pedindo esmola para os carros, nem fazendo malabarismos para ganhar trocados. Ele apenas estava ali, olhando para baixo com a mão no queixo, como se estivesse entediado. E talvez realmente estivesse – visto que no mundo dele não há muito o que se fazer, já que ele era um mendigo.

Perdi algum tempo observando-o, perguntando-me como ele vivia, se ele comia todo dia, se ele tinha amigos, que sejam os outros moradores de rua. Ou se ele estava cansado da vida miserável que tinha, com fome, com sede, sem amigos, nem mesmo os outros moradores de rua. Talvez ele estivesse esperando para morrer ali mesmo, no meio fio da rua mais movimentada da cidade. E será que as pessoas o notariam? Com certeza, a morte atrai a curiosidade – a tristeza também, mas não nesse caso. No máximo viraria notícia nos próximos dias, aí ninguém mais se lembraria. Assim como é toda e qualquer notícia. É claro que seria uma tragédia. Mas tudo isso é apenas fruto dos meus pensamentos.

O que me intrigou nessas duas cenas que imaginei foi que, em um mesmo mundo, em uma mesma cidade e em um mesmo ponto dela, há a diferença entre as pessoas tão evidente e ao mesmo tempo tão oculta. De um lado, pessoas ocupadas com suas vidas agitadas e do outro, há os que se perguntam todos os dias o porquê que eles existem. O ser humano, em geral, não tem a capacidade de enxergar além de si próprio e abaixo dos próprios ombros: ninguém se importa com ninguém. Todos estão tão ocupados e acomodados em suas vidinhas que não param e pensam se é isso o que vale a pena na vida. E vida, meu caro, você sabe o que significa? O seu trabalho é ótimo, sustenta você e sua família mas você não suporta acordar para ir ao escritório. Os seus dias estão todos anotados na agenda. Você sabe exatamente o que vai acontecer nele e como será. E como será? Rotineiro. Pura rotina. O homem tem o costume de se adequar ao sistema e ao padrão. O que, não é um erro, mas é um defeito que nasce com ele.

A vida é muito mais que o celular que você viu na vitrine, aquele que custa até mais do que você trabalha o mês todo. Mais que o seu novo carro importado que você quer tanto mostrar para o vizinho, que tem o modelo do ano passado.Enquanto isso, aquele cara sentado no banco da praça só quer uma marmita de cinco reais. Na realidade, ele precisa, se não ele morre de fome.

Enfim, a vida não é seguir a moda, não é querer mais que o outro e não é ter mais que o outro. É apenas ser. É isso que levamos dessa vida – seja lá para onde nós formos. Mas o que eu posso dizer? Esse mundo capitalista que gera tanto individualismo não podia ser diferente, certo?

Sinceramente, de todas as coisas que faltam no universo inteiro, uma delas é a humildade. Como diria Renato Russo: A humanidade é desumana mas ainda temos chance. Existem coisas de uma importância tremenda aqui na terra, que está pertinho de você, de mim, de todos. Só precisamos abrir os olhos e ampliar nosso horizonte.