POLÍTICO QUER MAIS É QUE O POVO SIFU, NÃO SABES?

A loura tinha a pele boa. Alva, altiva. Esnobava um traje elegante, nos trinques. Ao todo ela era bem diferente dos demais passageiros. Não tinha a pele amorenada e aquela cara de povo sofrido. Vai ver era uma dondoca dos rumos de Lagoa Santa. Daquelas que morrem de nojo de ter que dividir o ar num ônibus com sujeitos mau encarados e com mulheres com cara de casca grossa.

Conseguiu lugar para sentar no Move Direto. Enfrentou pacientemente a longa fila e tudo mais. Reclamava com a mulher a seu lado, que estava do lado da janela do ônibus, de ter que andar horrores pelo centro de Belo Horizonte até chegar na estação da Praça da Estação para conseguir seguir toda a distância até o ponto final em posição cômoda.

Dizia ela que não respeitaram o passageiro, o pondo para tomar a lotação em local distante, sujo e perigoso. Discutia com a senhora a seu lado o melhor local para a estação. Eu estava em pé e ouvia as duas conversarem enquanto eu desembolava o fone de ouvido para encarar a distância ouvindo música suave, de gente inteligente ouvir. E entre choradeira, xingação, descontentamento e pessimismo, muita aflição precipitada partiam das duas conversantes.

O ponto central de embarque e desembarque que estava gerando tumultos por conta das filas que se formavam e apavoravam porque as pessoas não admitiam ir em pé era provisório. Falavam que estavam para entregar um outro, definitivo, bem mais tranquilo e melhor acabado, em oito meses. O qual seria construído na Rua Oiapoque. Intrometi na conversa das amigas temporárias e disse isso para a loura.

E ela mostrou-me sua indignação com o meu comentário. Disse para o alto que a construção se dando no local que eu mencionei em nada ajudaria ao que ela se queixava. A Oiapoque fica longe do Centro também. "É suja e perigosa do mesmo jeito que a Praça da Estação". Voltou a olhar para frente e na linha de seus olhos negros. Senti o desprezo. E mais o quanto ela ficou incomodada consigo mesma por se sentir cri-cri e por se vir pouco cooperativa com a tentativa de melhora que um prefeito, um governador ou um presidente, que nunca fazem nada, tentaram implantar para o povo testar e chegar por ele mesmo o projeto no eixo.

O grilo dela, também, era por ter que encarar um passageiro diferente dos demais, que mais se parecia da estirpe dela. E de estar diante de alguém que sugeria para ela que o momento era de aguentar o tranco durante um tempo em vez de reclamar, reclamar e não ter na cidade uma solução em transporte que preste. E nem o que no momento estava quebrando o galho de uma forma bem melhor do que o que havia antes dele. Voltar à estaca zero ela bem sabia: não era alternativa.

Me arrependi de ter tentado mostrar para a sujeita que o cidadão precisava era de um pouco de paciência e de colaboração, pois o sistema inventado para os coletivos, que favorece o trânsito mais fluente, não era de todo o mal e que o tempo haveria de mostrar isso. A viagem, em comparação com os sistemas viários anteriores, com pista exclusiva para os BRT e com linhas diretas do centro até os bairros de periferia, sem paradas para pegar passageiros, em alguns horários, passou a gastar bem menos tempo. Um ganho de mais de trinta minutos. Fiz questão de contar dessa vez. Dá até para ir em pé na boa, sem se cansar. Lendo um bom livro, então, nem se sente a distância.

Me chateei com a indignação dela, mas consegui desembolar o fone e entupir meus ouvidos com as pontas dele. E eu já ia ligando o rádio quando a loura disse para a vizinha de poltrona: "Eles construíram a estação de partida onde está, construíram a provisória onde está e vão construir a estação definitiva na Oiapoque e não nos consultaram. Deveriam ter consultado os usuários.". Achei genial o comentário dela e quis desenvolver uma opinião meio militante, mas me contive e só disse "Sempre é assim que eles fazem". Depois disso, passei a receber nos ouvidos o sinal da rádio Guarani FM.

Eu ia falar para ela: Eles constroem o que querem e como querem e não consultam o povo. Fazem eles a necessidade da população e inventam eles o modo de saná-la. Quando a obra está pronta, vem a oposição botar um monte de defeito para a situação não crescer com ela e para botar o povo contra a situação. A imprensa fica a cargo de fazer a lavagem cerebral nas pessoas. Ninguém quer ver este país progredir e tomar jeito, essa é a verdade!

Só que não se vê essa imprensa falar isso que a loura falou sobre os usuários ou a comunidade não serem consultados quanto as soluções que os políticos dão para os problemas que envolvem o povo. E por qual razão a imprensa age assim? Quando as acusações são nitidamente boas para por o frágil povo contra o Governo só falta a ela ter um orgasmo antes de dar a notícia.

Os empresários que exploram o transporte coletivo em questão estão rachando de ganhar dinheiro da forma como o transporte está. E esses empresários fazem parte da roda que patrocina as campanhas dos políticos visando a materialização de seus interesses. Tanto os da Esquerda quanto os da Direita eles corrompem. E colocar as pessoas para refletir sobre o fato de o povo nunca ser consultado compromete essa corrupção sensível. Atrapalha os negócios de gente da própria cúpula. Por isso não se vê essa corja que dá as notícias e produz os levantes no Brasil falar contra o projeto do Move de Belo Horizonte de maneira honesta. A mídia não mexe nessa caixa de abelha que sai empresários zangados de dentro dela. E nem pode perder o dinheiro que deixaria de ganhar se o fizesse. Mercenários como são os donos dos veículos...

Depois que a elite por trás dessa corja conseguir o que quer, tirar o trabalhador do poder, vamos ver o que os membros dela farão para resolver a questão que a loura e a colega do lado discutiam. A hora boa de avaliar a verdadeira intenção desses conspiradores que vendem o escândalo da Petrobrás será essa. Vamos ver se satisfarão as expectativas das discursantes da lotação. Se vão gastar um dinheirão desmontando a estação de partida, construindo outra em um lugar onde as pessoas ficarão mais satisfeitas, tendo sido consultadas para isso. Se vão colocar mais ônibus para diminuir os espaços de espera e com isso as filas. Se vão melhorar as pistas, a fiscalização, a segurança do usuário, a higiene do local.

Para o impeachment da Dilma eles consultam quem quer que seja. Consultam impondo, recrutando, mas consultam. O que é do interesse deles eles fazem até humilhando-se, sabe disso ainda não? Não viu os caras votando regalias para eles – auxílio moradia para parlamentar – às vésperas do Carnaval e dizer que só voltariam para votar leis de interesse comunitária na volta do recesso? É com que tipo de filho da puta que achas que estamos lidando?

Meu palpite é que farão o de sempre: Uma coisinha qualquer que está ao alcance deles de fazer até mesmo agora, antes do impeachment da presidenta, se tivessem mesmo com vontade de governar pelo povo e não por interesses capitalistas. Coisas como reduzir o preço da passagem, que em BH abusivamente foi aumentada duas vezes em 2014 pelo prefeito do PSB. Mas esse adoçamento da boca do eleitor sairá daquele jeito: só para parecer que cumpriram com o prometido com o povo pela contribuição dada ao aderir o impedimento da atual presidente da república. E por pouco tempo deve durar essa gratidão. Tão logo o povo esqueça a tensão do impeachment, o benefício também será esquecido. Bem faz o metrô, que até hoje pertence ao sistema público e não se vê aumento de passagem há anos. Aonde que transporte público é melhor se gerido por empresários?

Ficam a dar moral para a televisão e não procuram verificar e refletir sobre essas coisas, por isso é que o ciclo vicioso prossegue: O povo volta a reclamar, a dizer que o governo da Direita não presta. "Volta Lula pelo amor de Deus". Até aí, tudo estará como dantes no quartel de Abranches. Sem o povo reclamar os políticos acham que não se governa no Brasil. É preciso crise para que eles pareçam ter utilidade. Eles trabalham é para você reclamar mesmo. Experimente elogiar, ainda que trabalho ruim que fizerem, para ver o que acontece. Eles entram em curto-circuito.

FRASE DO DIA: Pare de ver televisão e você vê o mundo melhor.