E...MEUS MORTOS CAMINHAM SOBRE DUNAS ( veridico)

A Ultima vez que eu o vi…Ele estava morto, mas atravessava um deserto e caminhava sobre Dunas na minha direcao.

Como numa tela de Dali, dentro de um universo surreal e estava sentada numa pedra nao muito alta redonda no meio da areia.

A minha direita uma floresta de carvalhos se agitava com a brisa, e fazia soltar das arvores folhas que flutuavam em todos os tons de verde no ar.

A minha esquerda montanhas rochosas de cor terracota, formas geometricas disformes, pontiagudas matizadas de vermelho escuro contrastavam com o ceu azul, e neste ceu azul claro sobre nossas cabecas corriam nuvens brancas como se rolassem ao vento.

Atras de mim...o mar

Na minha frente aquele ponto distante se aproximava...

So pude ve-lo quando peguei ao meu lado sobre a pedra um antigo telescopio ao estilo bucaneiro dos mares para que pudesse identificar quem vinha na minha direcao.

Era ele mesmo, com passos fortes postura ereta, vestido de modo incomum...

Um sobretudo da cor da areia, longo, batendo nas botas na altura do tornozelo e se entre abria a cada passo e com o movimento dos ventos.

Um chapeu alinhado que lhe caia bem mas deixava aparecer os cabelos brancos mesclados a cor castanha escura natural.

Galante, forte e tao bonito...quando percebeu que eu o havia finalmente reconhecido ele sorria com os labios e com seus olhos verdes

Tao lindo renascido de algum lugar , elegante e confiante como um Lord...Tao diferente da ultima vez que eu o vi...

Enrrolado com lencois verdes hospitalares ate a a cintura, bracos abertos e peito nu que comportava uma parafernalha de sensores, ligados a maquinas com letreiros digitais, isolado...Estava a dois passos dele quando os alarmes dispararam sonares e os medicos invadiram a sala expulsando-me...

Eu, entendendo o que os sinais significavam, lamentei nao ter podido segurar a sua mao.

Eu olhava nao mais na direcao do leito por sobre os ombros do medico que tentava me empurrar porta a fora...eu olhava para o teto e para a direcao das paredes e pedia baixinho para que ele voltasse de onde ele estivesse.

Sai da sala, com olhos vermelhos e solucos amargos...

Mas, eu lembro de outras tantas vezes que estive com ele...

E esses lugares na minha memoria sao lugares secretos que me confortam ate hoje.

Lembro na sua casa no campo, uma casa que tinha a fachada de pedra cintilante , portas e janelas azuis..do lado esquerdo e tambem do direito grandes pes de Umbus faziam sombras genorosas no verao e pareciam encantados com galhos retorcidos no inverno....

Cavalgamos juntos muitas vezes, eu no cavalo pequeno e barrigudo de cor baia e ele em seu cavalo alto e formoso Mouro, muitas vezes acompanhados dos seus caes...Luck, Batalha e Combate...caes de sorte e de guerra, tais como seus nomes.

Ele me exibia entre os seus amigos , contente e orgulhoso eu era a sua Unica neta mulher entre tantos outros netos homens, as vezes me punha no colo e penteava meus cabelos.

Essa nao e a melhor lembranca que tenho dele...

Lembrar de meu avo, tem cheiro de campo, de orvalho e terra...de cafe fumegante nas xicaras...tem cheiro de fruta e de folhas

Cheiro de animais, cocheiras

Sabor de leite recem tirado das vacas...cheiro das las das ovelhas, em epoca de tosa.

Ele costumava a me levar a uma turne para ver os animais recem nascidos, desde bezerros, carneiros, pequenos porquinhos rosados, pintos que seguiam sua maes, patinhos amarelos, gatos e qualquer outro filhote que pudesse encantar uma crianca

Meu avo era calmo, estava comigo quando lamentei ter cometido meu primeiro crime (assasinato) foi quando provoquei um incendio numa arvore muito velha ao ter improvisado um fogao de tijolos junto ao tronco para cozinhar, frutas em pequenas panelas de lata.

Ele bem que tentou salvar a arvore do seu ferimento, mas meses mais tarde aquela cicatriz nao pode ser curada e ela acabou morrendo.

Estava tambem por perto quando cometi meu segundo crime...colhendo frutas verdes aos montes no pomar para coloca-las em cestos e balaios e brincar de feira com meus primos...

Nunca me puniu, nem nunca deixou ninguem fazer isso...

Ele balancava a cabeca e sorria cabisbaixo, com uma boa conversa sem alterar o tom de voz e em poucos minutos nos deixava com a certeza de que haviamos feito algo que nao deveria se repetir.

O fato dele estar sempre por perto, nao impedia de que coisas que nao deveriam acontecer acontecessem...foi assim quando pratiquei o meu (terceiro crime) meu preferido...do qual pratico ate os dias de hoje o de promover a desordem!

Foi assim quando observavamos um tia varrer o patio caprichosamente que era bem grande, e assim que estava arranjado e limpo...convenci meus primos a colher flores sempre vivas no campo ( todas as que pudessemos) e coloca-las numa antiga charrete que ficava debaixo de um arvore...

Eram tantas, tantas que se transformaram numa montanha...uma montanha muito macia para se jogar da arvore sobre elas.

E tudo seria perfeito se nao fosse o vento forte que soprou aquela tarde, e com o vento a ideia de jogar as flores no ar...e deixar o patio com cara de que nao e limpo a seculos...

Desta vez, meu avo veio sorridente com uma vassoura para cada um de nos...

Ele era assim, calmo como um regato, de figura imponente como um cavalo campeao em prado largo, e convincente ...como um bispo, nem precisava dizer muito...

Ainda assim...tenho outras lembrancas melhores.

Fim de noite, fim da lida o barulho do cavalos sendo soltos nas cocheiras, a porta do galpao que rangia quando era aberta para guardar os utensilios do campo, e a expectiva de ve-lo entrar na casa, o Jantar, mesa rustica e familia reunida...ainda nao era o melhor

O melhor era o semi circulo que formavamos junto ao fogao a lenha, depois do jantar...filhos e netos reunidos numa especie de comunhao...nos criancas sobre um pelego almofadado sobre a caixa de lenha, meu avo sentado num banco baixo com a xicara de cafe fumegante nas maos.

Contava estorias, tantas que nao posso lembrar todas...

Creio que a primeira vez que ouvi falar de reinos distantes, rainhas, reis e castelos foi porque meu avo me contou a respeito deles...

Entre tantas estorias...haviam bruxas,animais assombrosos, tigres ferozes ...e a ansiedade de ouvir ate o fim cada estoria dessas aumentava quando ele mudava a entonacao da sua voz meio rouca...

Outras estorias eu ouvi, nao menos encantadas que contadas por ele sobre o passado, familia e sua juventude sempre pareceram fabulas.

Ainda assim eu acredito que quando o vejo a na minha mente...quando lembro destas coisas o melhor de tudo foi adormecer em seu colo enquanto contava seus causos, e eu com os bracos envolvidos em seu pescoco, com o ouvido colado em seu peito ouvia a voz dele sair la de dentro...ate adormecer...

Eu amava meu avo...

Eu ainda o amo, nas minhas lembracas...no modo que eu o vejo e sinto, e como estorias de amor tem finais felizes...

Nao e por acaso, que eu escrevi esta estoria comecando pelo sonho...pela morte e terminando na minha recordacao preferida, morna e mais aconchegante...

Assim quando levantar desta cadeira, nao estarei com uma sensacao de vazio,com coracao tao apertado, mas de certo modo me sentindo afortunada

feliz e com um sorriso nos labios de te-lo recordado com amor e saber que niguem podera roubar estes flasches da minha memoria.

(em memoria de meu avo. Aldo Andrade Avila )