Índios e sem-tetos de Manaus (ordem e progresso?)

Era 11 de março de 2008.

A polícia expulsou os índios sem-tetos da terra “invadida”,

em Manaus. Os índios enfrentaram a polícia com pedras, arcos,

flechas e paus. Tentaram defender os seus barracos,

único bem que lhes restava nesta vida.

Eram duzentos sem-tetos, sendo mais de cem índios

de sete etnias já bem reduzidas.

Mulheres, crianças, jovens e adultos

agonizavam enquanto seus barracos eram implodidos.

A defesa dos índios, que alegavam serem herdeiros da terra,

nem foi ouvida, já que no país dos índios

toda terra lhes foi roubada, recolhida.

Foram, antes, enxotados pelos cassetetes da polícia.

Foram acossados ante cães e cavalos da lei.

A corporação entrou em ação e os

sem-tetos índios ficaram na mão.

Só puderam ver a cena da demolição!

Não adiantou xingarem os Pms de carrascos,

pois, de qualquer modo foram eles que amargaram o fiasco.

Fiasco da existência negada, de filhos da pátria renegados.

Filhos de história reiteradamente demolida, apagada...

Os sem-tetos se desesperavam: indiozinhos, mulheres lutavam, apanhavam, choravam.

Tal qual toda sua quinhentista história de dor,

os choros indígenas pareciam não ter fim!

Os índios já formados, inconformados,

atiraram contra a polícia suas flechas.

Mas esses pobres não viram brechas na lei.

Antes, só viram as pechas da lei que,

“cega a injustiças”, expulsou os sem-tetos da BR AM-010.

Ficaram sem casa, sem rumo, sem nada.

A polícia estava bem armada pra defender os donos da lei.

Lei é lei, sem-teto é sem-teto, índio é índio,

invasão é invasão, cerca é cerca ...

Isso é que é o certo, e que se obedeça,

até o dia em que a coisa se inverta...

Mas como se inverter, se a lei

(tal qual as terras) tem dono?!...

O trator derrubou os barracos dos índios e sem-tetos.

Os sem-tetos foram retirados a unha.

Cães e cavalos da polícia foram testemunhas.

Se a justiça pudesse ouvi-los!... Mas, qual nada...

Pois tudo se faz para que estes animais

vivam melhor que os índios, pra defender a polícia!

De qualquer modo, a força bruta venceu mais uma vez.

Armas, cães, cavalos e gás lacrimogêneo ganharam a disputa.

Os índios foram expulsos pela PM.

A PM levou flechadas, amparada por escudos, pelo Estado... Quanto aos sem-tetos-índios aprenderam a lição bem dada:

se eles não sabem nada, não sabem o que é cerca,

que ao menos sigam a lei, e obedeçam quem manda.

Em país que branco tomou conta e impõe sua sensatez,

índios, sem-tetos não têm ponto,

índios, sem-tetos não têm vez...

Afinal, é necessário defender a sociedade contra a barbárie

e ensinar a essa gente bons costumes

e os verdadeiros sentidos de nossa civilização!

Dentre incontáveis pedagogias (mesmo que militarizadas),

o episódio da BR AM-010 foi certamente mais uma lição

dentre outras centenárias para estes selvagens invasores

sobre como as coisas funcionam

no país da "ordem" e do "progresso"!

(Poema extraído do Livro: "Geografia em poesias: tempos, espaços, pensamentos - Luiz Carlos Flávio)

Luiz Carlos Flávio
Enviado por Luiz Carlos Flávio em 24/04/2015
Reeditado em 25/04/2015
Código do texto: T5219211
Classificação de conteúdo: seguro