Um Sr. Cabeça de Batata
Sem me entender, para não enxergar o que me confundia e saber quem – ou o que – sou desatarraxei meus olhos de plástico do rosto. Mas meus ouvidos me faziam escutar sons que me impediam a compreensão.
Sem me entender, me senti ainda pior.
Tirei minhas orelhas com a certeza de que nada mais ouviria a me persuadir, mas fui traído por meus sentidos quando, na ponta da língua, definições impulsivas e confusas me surgiram.
Sem me entender, me senti ainda pior.
Não hesitei, tirei minha boca com a esperança de não mais variar daquela forma e, enfim, me compreender. Veio-me, então às narinas, o cheiro da dúvida a consumir o meu corpo.
Sem me entender, me senti ainda pior.
Agora sem nariz, a fim de encurtar o percurso da dúvida, tirei minhas pernas para cercá-la em meus braços.
Sem me entender, me senti ainda pior.
Já em estado de autopunição, mas pensando tê-la (a dúvida) finalmente em minhas mãos, arranquei-me um braço; e me enganei.
Sem me entender, me senti ainda pior.
Debatendo-me ao chão, perdido em minha lucidez, desprendeu-me o outro braço. “Pelo menos, assim, não busco mais respostas”, pensei.
Senti-me ainda pior.
Ofegante, confuso, desolado e sem forças para nada fazer.
Ainda pior.
O vento soprou entre meus encaixes, dos furos das orelhas aos olhos, do nariz à boca.
Não pude mais ver, ouvir, falar, cheirar, andar e tocar, mas pude sentir.
E foi em minha cabeça-tronco, de dentro para fora, que pude entender do que realmente sou.
No final das contas, pude pensar e me sentir melhor.