Reféns do futuro

Como de costume, estava aguardando meu almoço no restaurante onde vou às vezes, quando entraram duas mocinhas, aparentemente, estudantes. Antes que o garçon apresentasse o cardápio, uma delas já com o telefone nas mãos, pediu a senha local. Pedido atendido, as duas simplesmente tomaram a posição já conhecida de olhos na telinha, cabeça baixa, silêncio absoluto e dedinhos no comando. Olhei em volta e percebi outros ao meu redor na mesma situação. Veio à minha mente a última reunião de família, quando comemorávamos um aniversário em minha casa. Situação parecida. Os mais velhos comendo e bebendo em volta das mesas e a turminha dos jovens em silêncio, cabeça baixa, todo mundo de olho vidrado na tela do aparelhinho que não tiram das mãos. Não se ouvia conversas, nem diálogos, nem as brincadeiras, antes tão presentes nesses encontros. Uma pena...

É muito triste a alienação a que os jovens estão vivenciando. O que a tecnologia vem trazendo de conseqüências negativas para os jovens quase se nivela com os benefícios que trouxe para o mundo. Lembrei-me de uma charge que vi há pouco tempo, onde havia o desenho de um pátio de escola na década de 80 com as crianças correndo, brincando, pulando e se interagindo debaixo da sombra de uma árvore. Ao lado, a imagem nos dias de hoje com as crianças no mesmo local, todas assentadas e com o olhar vidrado nos benditos aparelhinhos, onde o único movimento que se via era o dos dedinhos. Conclusão: o vício com a internet e seus recursos está acabando com o pouco que restou da imagem da infância, que já perecia na solidão das casas entre os muros altos por causa da violência, no confinamento dos quartos onde a TV e o computador viraram companhia e elemento de ligação com o mundo. Aquele tempo em que as brincadeiras eram a liberdade nas ruas e o momento mais esperado na hora do recreio acabou. Agora a moda é enviar mensagens, whatsapp, enviar e receber fotos do momento, os selfies da vida. De manhã, foto no espelho. No almoço, o que estou comendo. Na rua, o que estou fazendo, a produção para a balada, a turma noite, o giro na festa, o que rolou, o que valeu ou não valeu a pena. Tudo ali, captado e divulgado instantaneamente para quem quiser ver. E não ficam só no troca troca de endereços, vai para a rede social também. E é lá que existem os amigos, milhares trocando mensagens que enviam da solidão de seus quartos ou de suas vidas, onde o convívio com pessoas de verdade muitas vezes não existe.

Tenho muita pena da juventude de hoje, com tantos recursos nas mãos, com o mundo inteiro aos seus pés e totalmente alheia ao que acontece à sua volta, porque só vêem o que rola na tela de seus telefones. A leitura é visual, superficial, só a imagem impressiona. Ninguém vai a fundo, ninguém analisa, ninguém se emociona com nada. Tudo ficou automático, praticamente estático no mundo de hoje. É tão fácil ter acesso à informação e ao conhecimento de tudo que existe ou já existiu no mundo, mas a maioria não sabe ou não quer saber de nada. Pra que, se já está tudo pronto? Sabem que se for preciso obter algum dado, é só apertar um botão. Telinha cheia e cabeça vazia. E nós, da geração passada, de mãos atadas, reféns de uma era que nos pegou de surpresa e nos deixou de queixos caídos com as mudanças que aconteceram na velocidade da luz. Somos reféns do futuro, saudosistas do passado, buscando nosso lugar num presente onde assistimos perplexos o nascimento da era virtual, dominada por chips, em imagens 3 D, entre plasmas e leds, e não sei mais o que virá amanhã. E pensar que há pouco tempo nossa grande evolução era o raio laser...

maria do rosario bessas
Enviado por maria do rosario bessas em 27/05/2015
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