Vermelho sangue, vermelho fogo

“Era uma vez, um reino muito antigo cheio de magia, felicidade e luz. O rei era um homem bondoso e justo, a rainha havia morrido dando a luz à princesa Prousty que havia nascido com os cabelos cor de sangue parecidos com as pedras das montanhas do reino, chamadas de proustite pelos aldeões.

Os anos foram se passando e Prousty crescia sendo amada por todos os seus súditos e por seu pai. Mas, um dia caiu uma tempestade devastadora e se ouviu por todo o reino o Choro do Relâmpago.

Anos atrás viveu um demônio que matava e roubava almas sem piedade alguma. O demônio, em forma de um lobo gigante, soltava raios pela boca e todo seu corpo era rodeado por uma corrente elétrica. Os mais antigos o chamaram de Choro do Relâmpago pelo som que era ouvido quando ele aparecia.

Por muitos anos o demônio devastou as vidas do vilarejo e por fim adormeceu no coração da montanha. Gerações e gerações vieram acreditando cada vez menos na história até a tempestade chegar e o demônio com ela.

A princesa havia aprendido a magia antiga do reino com as sacerdotisas do castelo e decidiu enfrentar o monstro que destruía tudo que ela havia conhecido, mas por ordem do rei foi trancada no alto de uma torre. As sacerdotisas alertaram o rei: COMBATA FOGO COM FOGO OU MORRERÁS! O rei cético sobre magia e bruxas de outra época, reuniu seu exército e atacou o demônio e com um só golpe todos os seus homens foram dizimados...

Prousty vendo tudo do alto da torre, sentiu uma raiva tão grande que seu único pensamento era o desejo de vingança pelo seu pai que a amara tanto. Em todo o seu desespero e fúria, realizou um ritual proibido: acendeu uma vela para cada direção do mapa, ao redor desenhou um círculo e uma estrela dentro com sangue de corvo, seu sangue e fios de seu cabelo... Incendium fert lucem. Sanguinolento parere vocanti. Adolebit diabolus, comburendum fulguris. Stuck in inferni, excursus est reddebat.

Do fundo da terra, saiu um cavaleiro em chamas sob um cavalo feito de ossos negros. A guerra entre o relâmpago e o fogo durou séculos e a princesa foi possuída pela sede de seus próprios demônios morrendo em agonia por fim.O fogo venceu, mas queimou toda a Terra e deixou os filhos de sua luz vagando por todo lado.”

Minha avó costumava me contar essa história e dizia que um dia a princesa bruxa ressuscitaria para governar o reino que ela perdeu. Meu nome é Ádria e minha mãe dizia que é derivado de um deus chamado Adar, Deus do Fogo, mas eu não ligo muito pra essas coisas de deuses e espíritos e blábláblá. Eu só acredito que algumas pessoas possuem tipo uns poderes bem estranhos para atrair problemas, quando eu fiz dezesseis anos os meus começaram a piorar e foi um inferno na Terra.

Quando eu era mais nova, estava discutindo com a minha mãe na cozinha e de repente o fogão explodiu. Ficamos no hospital por dias, mas minha mãe não sobreviveu e incrivelmente eu não tenho nenhuma marca das queimaduras. Desde que isso aconteceu eu odeio fogo. Meu pai se casou outra vez, mas uns meses depois ele foi atacado por um cachorro e não aguentou. Minha madrasta me deixou com minha avó e vivo nessa cidadezinha afastada de tudo desde então. Parece que qualquer coisa que possa pegar fogo vai pegar bem na minha cara! Maldito Murphy!

06:00 AM

-Ádria, acorde! Precisa se arrumar pra escola, preguiça!!

-Só mais cinco minutinhos vóó!!

-LAVANTA AGORA ÁDRIA!!

E lá vou eu pra mais um dia emocionante na escola onde nada acontece... No último horário fui para o laboratório pela aula de química e a sala teve de formar grupos e usar as lamparinas disponíveis pra experiência. Ótimo, fogo de novo, Murphy de novo! Foi quando e imbecil do Marcos – meu colega de grupo – resolveu encher meu saco com o isqueiro da sala. Ele sabia que eu tinha medo e adorava me ver entrar em pânico.

Quando ele quase queimou meu braço, dei um grito de pânico e de todas as lamparinas saíram chamas enormes, vibrantes. Meus colegas saíram correndo de medo e eu fiquei encolhida no chão até o professor me buscar. Voltei pra casa mais cedo e fui deitar pra acalmar meus nervos, minha avó sentou ao pé da cama e começamos a conversar:

-Ádria, você se lembra da história que eu costumava contar sobre a princesa dos cabelos cor de sangue?

-Mais ou menos, não é bem uma história pra dormir!

-Rs, verdade. Mas quero que se lembre da parte que diz que a princesa é uma bruxa que invocou um cavaleiro do fogo. Sabe, a história conta que isso refletiu nos poderes dela transformando a princesa em uma manipuladora do fogo.

-Como assim?Ela tacava fogo nas coisas? – Eu não estava entendo nada daquela conversa maluca.

- Não é bem assim. Você sabe que no mundo existe o que chamamos de quatro elementos: água, terra, fogo e ar.Existem pessoas que podem manipular esses elementos, as elemental veneficas. Pode-se dizer que são bruxas. Uma bruxa que possua o fogo como sua natureza não sai por ai “tacando fogo nas coisas”. Ela é treinada para ter o controle das chamas e aprender a criá-las quando quiser. Uma elemental venefica pode aprender a manipular todos os elementos, se tornando uma bruxa suprema... summum auguratricis.

-Tá! E o que isso tem haver comigo, vó?

-Ádria, você é burra?! Pelo amor viu!! Estou tentando te dizer que você É uma elemental venefica! Sua natureza é o fogo e precisa aprender a controlá-lo!!

-Vó... VÓÓ, não viaja vó!! Eu morro de medo de fogo, como eu possa ser uma bruxa do fogo se eu tenho medo de fogo? – Isso que é uma velhinha gagá.

-VOCÊ É! As coisas pegam fogo perto de você porque essa é a forma da sua natureza se comunicar. É como se eu todo o poder preso dentro de você quisesse conversar e como ele vem principalmente do fogo, tudo acaba incendiando. Você é o tipo de bruxa que chamamos de Cethegi, a bruxa incendiária. Você tem medo porque não sabe controlar e libera seu poder sem perceber quando se irrita ou fica assustada, pode parecer horrível, mas foi por isso que a cozinha pegou fogo aquele dia.

Meu mundo havia desabado. Minha avó me diz que eu sou uma bruxa do fogo e que eu matei minha mãe. Não posso aguentar isso! Não consigo parar de chorar, isso não pode ser verdade. Eu matei minha mãe por alguma besteira de criança... Não é verdade!!

De repente o quarto estremece, minha estante sacudia tanto que todos os meus livros caíram no chão. E eu entrei em um pânico maior ainda.

- Ádria, pelo amor de Deus acalme-se!! Você vai destruir a casa assim!!

-ME ACALMAR?? ME acalmar?? Haha, você diz que eu sou uma bruxa, diz que eu tenho poder de fogo e que por não controlar eu matei minha mãe e ainda quer QUE EU ME ACALME?????

-QUERO SIM, INFERNO!! Sua mãe morrer não foi sua culpa, você era muito pequena e eu não achei que iria se manifestar tão rápido. Mas se algo acontecer a partir de agora, será sua culpa porque você já sabe do que é capaz.

Fiz o máximo pra me acalmar e o quarto ficou calmo novamente.

-Quando você estiver com a cabeça mais relaxada eu te ensino o que você precisa saber, mas por hora você tem que dormir e colocar seus sonhos em dia. Sabe, os sonhos nos dizem muitas coisas e com eles podemos resolver muitos problemas.

Rest cruciatu animi. Fit et luna noctu aduenit. Stellato sunt tui praevaricati. Somno, puella. Somno.

Nunca tinha ouvido minha avó falar daquele jeito, mas quanto mais ela repetia aquele verso estranho, mais pesados ficavam meus olhos e eu acabei dormindo por fim.