No meu tempo as coisas eram melhores...

“No meu tempo as coisas eram melhores...”, essa expressão geralmente é o ponto de partida para conversas saudosistas. Os assuntos abordados nelas são muitos: música, novelas, filmes, e até a forma com que as pessoas lidam uma com as outras. E o alvo, como não poderia ser diferente, são todas as coisas atuais. Mas não se enganem, esse tipo de prosa não é exclusividade de pessoas de idade, os (atualmente) jovens também falam assim. Tenho 27 (não sou tão jovem assim), e também tenho meus arroubos de nostalgia sobre os anos 90.

Ao investigar os porquês do fim da MTV Brasil em canal aberto(setembro de 2013), descobri que 33 anos antes, no mesmo prédio, a Tupi estava sendo lacrada. Três décadas separam esses dois eventos, entretanto há dois fatores atemporais em comum: O fato da competitividade trazida pela inovação tecnológica ter sido decisivo para o malogro dessas emissoras, e o saudosismo que elas legaram para seu público.

Os detalhes e reais motivos do lacramento da rede Tupi não estão bem esclarecidos. Pessoas que trabalhavam nela, ou que viveram essa época relatam uma estranha teoria da conspiração envolvendo Globo, Silvio Santos e Governo Militar. Difícil de acreditar que chegou esse ponto, mas não duvido que houve interferência de poderosos, afinal uma emissora que fora referência 5 anos antes, não fecharia tão de repente. Enfim, o que é consenso entre as versões é o fato que a competitividade acirrada trazida pela Globo foi o principal motivo para o declínio da Tupi. A TV Globo surgiu em 1965, tendo como embrião a Rádio Globo e apoio técnico do grupo americano Time-Life (empresa de comunicação que tinha mais “know-how” em jornalismo e TV).

No caso da MTV Brasil, o processo foi menos intrincado e controverso. Ela transmitiu pela primeira vez em Outubro de 1990, a desde então tornou referência em música (principalmente “rock”) e programação para jovens. Nos anos 90 e início dos 2000, não havia internet com velocidade e muito menos “Youtube”. Ou seja, quem queria assistir algo além de axé, pagode e sertanejo, tinha que assistir a MTV Brasil. Agora com poucos cliques num celular qualquer cidadão pode assistir um clipe novo ou antigo. Isso acarretou no declínio, e na posterior venda para o grupo da revista “Rolling Stone”. Atualmente a “nova” MTV Brasil é acessível apenas na TV por assinatura.

Esses são tristes acontecimentos tão afastados no tempo e ironicamente tão próximos no espaço (mesmo prédio). Outra coincidência que percebo é a nostalgia com que os antigos telespectadores falam dessas emissoras. Como em todo saudosismo, há uma forte carga de idealização. No caso da Tupi remete imediatamente à ideia de mais calor humano (como falava o bordão dela – Tupi, mais calor humano) e aos “bons tempos” dos anos 60 e 70, sem contar a memória de programas antológicos e populares como o do Chacrinha. No caso da MTV Brasil, a sensação é de perda da jovialidade e atitude na música e na televisão. Eu mesmo posso descrever, com uma pitada gostosa de idealização, a sensação sem igual que era esperar meus clipes prediletos passar na programação, torcer para que eles fossem escolhidos nas votações, assistir a apresentação dos VJs (como eram chamados os apresentadores dessa emissora), e até de ver aquelas vinhetas psicodélicas que passavam no comercial. Ver MTV era como abrir a porta para um mundo feito para gente como eu.

Bom, acabou. E se pensar bem, nem era tão bom assim. E por melhor que tenha sido, não há como essas duas emissoras sobreviverem no cenário competitivo atual, e ainda que sobrevivessem, seria “em estado vegetativo” como foi o caso da MTV Brasil nos seus últimos 5 anos. Nós criamos as mudanças, nós sustentamos as mudanças através de nosso poder de compra. As empresas que não se adaptarem falirão. Os empresários que insistirem na inércia ou não mudarem de ramo perderão tudo que têm. Mas nós, pobres mortais, na nossa vida tão pequena, frágil e efêmera, temos a dádiva de poder manter em nossos corações e nas prosas de bar, as lembranças de épocas em que fomos realmente felizes.

 

Filipe Magalhães
Enviado por Filipe Magalhães em 07/06/2015
Reeditado em 07/06/2015
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