Na colmeia

Em seu pequeno alvéolo de cera, cercada por suas irmãs, ela ainda não sabe que seu voo será diferente, que seu gosto por flores escuras e sem cheiro será mal compreendido, que o seu silêncio será mal visto e perturbado. Ela não sabe que sua dificuldade em se localizar nos bosques e voltar para casa sem se desviar será devido a uma desorientação nata, a um pendor por lugares escuros, frios e silenciosos, onde ela encontrará uma beleza que suas irmãs não aceitarão.

Tudo ainda está se formando ali dentro, lentamente, mas logo ela estará pronta para o primeiro voo, a primeira flor, o primeiro mel. Seguir o programa da colmeia será sua obrigação: realizar bem suas tarefas, como tem que ser. Não haverá espaço para o desvio, para a poesia das flores tristes, dos silêncios, da escuridão e dos ventos gelados. Não haverá espaço para a diferença, para o não ser o que todos são, o não fazer o que todos fazem.

Ela não sabe que será acusada de traidora só por discordar de uma coisa e outra; que a caluniarão pelas costas, sem lhe darem o direito de se defender; que será punida com base em verdades, mas também em mentiras. Não sabe que será forçada a entender que na colmeia só há um único tom de marrom, um único tom de amarelo, um único programa a ser seguido e defendido, e que brilhos próprios não serão permitidos. Criatividade, nem pensar!

Ela ainda não sabe do seu pendor por criar...

Na colmeia tudo é fechado, tudo está predeterminado, é só seguir.

Mas ela irá por outros caminhos. Em seus desvios pelos bosques e matas verá coisas novas, belezas diferentes... Poesia... sobretudo poesia... E sofrerá. Ela ainda não sabe...

Acorde jovem abelha! Já é hora. E ouça-me: aconteça o que acontecer, seja fiel a você mesma. Não se entregue. Viva! Mas não bata de frente sem precisão, não brigue muito, resista o máximo que puder sem gritos, passivamente, para não te prenderem, não te expulsarem, não te matarem. Seja você! Vá por desvios SIM! Seja como os bugres selvagens, caminhando livres pelas matas, mas com cuidado, em silêncio, calmamente, suavemente...

Mesmo assim vai doer. Ô se vai...

Flávio Marcus da Silva
Enviado por Flávio Marcus da Silva em 11/06/2015
Código do texto: T5273399
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