Os Doidos da Família


Senhoras e senhores, devo lhes confessar: eu adoro doidos.
Os doidões de hospital psiquiátricos, não, desses eu tenho medo. Gosto dos mansos, amigáveis, que são como crianças.
Na minha família tem muitos assim, de pai e de mãe, consaguíneos ou de parte afetiva.
Esse querer bem eu herdei do pai. O pai tem um afilhado doido. Conta mangando que, quando foi chamado para ser padrinho, foi logo de um doido.
O afilhado, que já tem os seus quarenta anos, quando avista o pai na rua, de longe, já grita: "padriiiiinho!" e os outros carreteiros bolam de rir. Então é um festival de beijos, abraços, bênçãos e moedas de um real.

Todo mundo lá em casa é doido pelo doido. A mãe me proibiu de citar nomes, disse que não é ético. Então vamos chamar ao afilhado de Lolô.
O Lolô é um amor, puro, inocente como um menino. Adora ganhar doces, moedas, roupas. Certa feita a minha irmã foi visitar a família do Lolô e levou umas roupas usadas para ele. Foi uma festa. O Lolô fez do alpendre passarela e desfilou toda a "coleção" para ela ver.
A certa altura ela teve sede e foi ao pote. Observou os copos e, bem, o Lolô não tinha lá esses cuidados com a higiene bucal. Ela pensou, pensou e avistou um copo de alumínio bem limpinho e areado, pendurado num arame e a mana, toda cocota, bebeu água, lavou o copinho no alguidar e pendurou de volta. Aí, lá se vem o Lolô: "ô sede, tia!"
"Thibungo" no pote, "gut gut gut, ah! meu copinho!" E a minha irmã murchou. O copinho do Lolô era o tal limpinho e areado que ela julgara ser das visitas.
É uma bênção na vida dos velhinhos, seus pais.
Bênção, sim, o aposento do Lolô ajuda muito nas despesas, graças a Deus.
Tem uma estória muito da engraçada de que um dia, observando a barra (faixa de luz no horizonte que precede o nascer do sol) o Lolô exclamou, com um suspiro:

"Oh, barrão bonito!..."

O pai dele, de dentro de casa, pensando tratar-se de um barrão (porco), disse "joga pedra, Lolô!"

Pra que.

O Lolô ficou uma fera. Deu um grito desde o alpendre que do quintal as galinhas escutaram:

"Tá doido, féla da puta véi! Jogar pedra nos barrão de Deus!"