Depois do amor

Depois do amor, amei mais. Porque não havia mais o ciúme, a possessividade, a cobrança desnecessária, a carência, a grosseria, a intolerância, o sono, o medo, a raiva, o descontentamento, o silêncio.

Depois de você, eu amei mais. Amei a tua ausência no sofá. A ausência das tuas reclamações, aflições, perturbações. Eu te amei mais, muito mais, porque você estava mais forte em mim, já que estava em sorriso, em alma, em paixão. Como se de ti, eu tivesse coado apenas o doce, o saboroso, o excitante.

Eu amei o que imaginei que você estivesse fazendo. Você já não era o verbo. Mas o verso que insisto em fazer como resto de prazer em te ter como companhia. Como se o verso fosse a forma de estamos juntos... sem estar.

Depois de você eu amei mais. Você bem longe de tudo que eu apreendi. Tão maior, além do que eu sei de cor. Tão só, tão minha, na apreciação das linhas da boca, desenhando o desejo, a árdua vontade de deslizar lábios em peles sedentas. Amei você como a possibilidade. A relação longe das amarras, do sufoco. A relação longe da relação.

Depois do amor, apenas o amor. O que me faz melhor. Amo e amei você, mesmo depois do bater da porta, depois da frase solta, machucando a nossa vaidade. Amei os teus rastros, as pegadas que se apagaram, o abismo onde muitas vezes naufraguei mas que me ensinou também a flutuar.

Amo você depois de você. Amo você em mim, antes do fim. Amo assim, como quem não pede nada em troca. Pego-me sorrindo, amando você em pensamento a me dizer: "Como você tá?". E muitas vezes respondo e do nada a gente começa a conversar. Sem brigas, apenas risos cúmplices de antigos amantes que ainda encontram serpentinas no fundo do bolso e as lançam em festas solitárias.

Amo você depois que você se foi sem dizer adeus. Amo você sem você, como se eu lapidasse a tua pessoa até restar a essência, o que me cativou.

Depois de você, restou o amor. Os olhos brilhantes, iguais ao do começo da paixão. O olhar virgem, sem fúria. As mãos enormes em carícia. A euforia do existir. Os lábios a comprimir num beijo.

Depois de você, todo amor. Tudo o que não morreu, não morre e não morrerá. Eu te amo, te amei e amarei. Porque o amor não tem culpa daquilo que fizemos dele.

O amor continua. Nós é que mudamos de endereço.

Raul Franco
Enviado por Raul Franco em 06/07/2015
Código do texto: T5301891
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