A Loteria
 
Esse causo aconteceu de vera a um conhecido meu, ex namorado da minha irmã.

Certo dia, contou o ex, como de costume foi tomar um cafezinho na casa de um seu amigo de infância, cuja família era mesmo que ser a dele. Davam-se bem demais. Muito amigos. A sobrecoxa do frango a mãe do amigo guardava para ele, caso fosse almoçar com eles. Adoravam-se. A mãe, o pai, o amigo, o do meio e o menor. Gente muito boa.

Quando chegou em frente ao portão ouviu um converseiro alegre, uma energia que daria para iluminar o Castelão em noite de Clássico-Rei."Tem coisa boa aqui", pensou o ex. E entrou. Sim, já era de casa. Entrava sem cerimônia.

Na sala, todos reunidos, o cachorro abanando o rabo loucamente, correndo de um para outro e pulando em cima do sofá com as patas sujas e ganhando muitos afagos. Mas quando o viram, calaram-se, ficaram desconfiados e mudaram de assunto.
O ex quis ficar sentido, perguntou o que estava acontecendo, levantou-se para ir embora.
Aí a amizade falou mais alto. Ele era como se fosse da família, afinal. Na verdade queriam era botar na rádio que alegria grande não se guarda. A mãe contou, saboreando cada palavra, os olhos brilhando e as mãos trêmulas.

Tinham ganhado na loteria. O pai chegara da rua com a notícia. Há três dias o menor escolhera os números, o pai jogara e o bilhete fora sorteado. Estavam ricos. Iam comprar um apartamento no Meireles, uma casa em Jeri e um carro de luxo para cada um. Isso era só o começo.
O ex quis dar uma gaitada mas segurou a tempo. Eram seus amigos, não mereciam.
Falou com muito jeito para não magoá-los. Não eram aqueles os números sorteados. Inclusive estava com o jornal, o pai certamente devia ter ouvido errado e, na euforia de ganhar, anotara os que tinha jogado.

Faltou energia no Castelão. Uma pesada acertou o cachorro que saiu ganindo no rumo da cozinha. Não eram os números que o menor dissera.
A mãe olhou com ódio para o pai. O menor escapuliu antes da tempestade. O do meio colocou os fones e o mais velho se encolheu no sofá.
O ex, vendo que a situação ia ficar muito perigosa, inventou um compromisso de última hora e pegou o beco. Após o episódio a amizade foi esfriando, foram se distanciando. E ficou a lição: nunca seja portador de notícia ruim; deixe que os outros descubram por si mesmos.
Srta Vera
Enviado por Srta Vera em 12/07/2015
Reeditado em 12/07/2015
Código do texto: T5308721
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