Outra de Calcinha


Já desci do ônibus achando graça desse causo. Enquanto o Parangaba Aeroporto não chega vou escrevendo.
Se quando eu era pequena eu queria ser rica a Vanda, minha irmã, era rica. No David Vieira ela era conhecida como pessoa de posses inclusive fazendo pouco das coleguinhas pobres que por vezes iam à escola sem almoçar.

A Vanda, como eu, tinha vergonha das calcinhas que a mãe fazia. Na hora do recreio ficava quietinha, pernas juntinhas e mãos no regaço. As amigas pensavam que era jeito de menina rica. Daonde, era medo, mesmo! Vai que ela ficava em pé e um vento mais atrevido levantava sua saia azul, exibindo ao mundo a calça horrenda! Nunca na galáxia.

A Vanda já vivia em uma realidade paralela onde nós comíamos carne todo dia, tínhamos tv em cores e até uma fazenda fantástica na cabeça dela já tinha. Só se fosse de piolhos.
Gente, era de jogar pedra. Quando as coleguinhas narravam as necessidades pelas quais passavam, umas tinham ido à escola sem almoçar, outras, comido só feijão com farinha, a Vanda se fazia de desentendida (PhD em feijão com farinha que ela era) e dizia "mulher, deixa de ser besta, pula em cima da carne de gado, da carne de porco, do frango assado!" E as amiguinhas ficavam sentidas, "armaria, a Vanda, só porque é rica, pensa que a gente também é..."

Apois. Certo dia a Vanda teve vontade de ir ao banheiro. O pátio fervilhando de crianças, o sol mandando brasa. Levantou-se, alisou as pregas da sainha azul, ajeitou o cabelo e saiu andando à maneira de uma atriz que ela vira na tv, a cabeça meio pendida para olhar de viés.
Na mesma hora, minuto e segundo que a rica se alevantou um menino, do outro lado do pátio, meteu o pé na carreira. A minutagem foi perfeita. Um verdadeiro encontro escrito nas estrelas.
"Pou!" E a Vanda caiu no meio de pátio, de pernas pra cima, a calçona exposta ao opróbrio da canalha.

Penso que a primeira coisa que ela comprou quando recebeu o primeiro salário do santo banco foi umas dez calcinhas de banca. Eu? Marminino, ligo pra isso não, compro no mercantil, três por dez, até mais barato na Feira da Sé. Tou nem cagando dinheiro!
Srta Vera
Enviado por Srta Vera em 13/07/2015
Reeditado em 13/07/2015
Código do texto: T5309151
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