Leitores, é fato: toda família tem um bêbado. Ou um louco. Ou os dois.
Particularmente gosto de conversar com bêbados e loucos. Reitero: os inofensivos, os do bem. Dos violentos eu corro sem olhar para trás.

 

Sábado passado eu estava debaixo de um pé de Oiti, fumando um cigarro, esperando o ônibus. Do outro lado da avenida ia passando um bebinho e, ao me ver sozinha, quis estabelecer contato. Saudou-me, beijou minha mão, apresentou-se. Disse que era sargento da PM e morava no condomínio tal, o mais chique do bairro e que inclusive a mãe estava à sua espera para almoçarem mas ele precisava fazer a minha proteção. E postou-se à beira da pista, muito magro, só de calção, de braços cruzados. Enquanto isso ia me dando comandos: que eu não falasse ao celular no meio da rua, não me aproximasse de carros que porventura viessem a me abordar com supostos pedidos de informações, que continuasse a fumar. E o porteiro do meu prédio só mangando lá de longe daquela arrumação.
Vez em quando um carro parava, o motorista querendo certificar-se de que estava tudo bem. Donzelas em apuros afinal não saem de moda.
E o mais engraçado é que o sargento conhecia todos eles. As coisas que disse eu não vou transcrever porque sou uma escritora de família mas os amigos podem imaginar.

Apois. Passados uns vinte minutos eu caí na besteira de sugerir ao sargento que fosse ao encontro de sua excelentíssima mãe no condomínio de luxo, já passava das treze horas, tarde para almoçar. Oh, rapaz. Pra que. O bebinho ficou valente que só uma saraça:
"Cale a boca, sua nêga!" Depois adoçou: "nêga não; morena."

Nisso eu estava a ponto de explodir em gostosas gargalhadas. Disse com coquetismo: "mas eu sou negra...", e ele retrucou "se você disser isso de novo eu lhe processo por racismo." Aí não teve como segurar o riso. No ente o ônibus chegou e eu embarquei escoltada pelo ilustre sargento da PM que gostava de tomar banho de piscina em seu condomínio de luxo.