Carente de razão

Andava desesperada. Desacreditada, seria melhor dizer. Ele dissera que não havia lugar para ela em sua vida. Que não era o momento certo e precisava ficar um pouco sozinho. "Sozinho"- doeu no ouvido ouvir. Sabia bem o que aquilo queria dizer. Sozinho da presença dela, mas completamente cheio, satisfeito e farto de sua ausência. Quer dizer, sozinho com as outras; para as outras. Sozinho pra viver a vida, aproveitar, perder-se em outras bocas e em outros braços se encontrar.

Pensou no quanto seria justo dele se vingar, pois não se renega um amor que se quer doar assim. Pra começar não se renega um amor, seja qual for. Sentiu-se culpada. Não era bem vingança. Não assim, não com aquele peso todo. Era só uma vingancinha dessas à toa. Numa boa. Coisa de criança. Coisa de mulher contrariada. Só pra descarregar aquela raiva toda de ser rejeitada. Só pra não chorar, pra não gritar, pra não implorar para ele ficar. Só pra dar leveza a um coração cansado de sofrer.

"Vingança não é leve", pensou. Vingança não é legal. Vingança estava fora de cogitação, ponderou. Porque sim, era uma mulher sensata e não uma criança mimada. Porcaria, estava cansada. Cansada de ser uma mulher, de ser uma adulta, de ser uma pessoa que nem se quer era capaz de poder se vingar em paz.

Correu os olhos pela tela do computador. Encarou por um instante a foto do perfil dele estampado naquela rede social, onde mais tempo passava do que na sua própria página. Merda, ele era lindo! Era uma porcaria de um moreno alto de cabelos bagunçados e nariz perfeito. Um nariz que parecia colocado ali, desenhado por Deus, furtado do paraíso... ele era a coisa mais linda da vida e ela era uma tola apaixonada que não sabia mais como fazer pra seguir a vida sem ele. Sem poder tocar, abraçar, beijar... sem poder nada.

Tinha um recado estranho ali. Intruso. Uma tal de Ana. Uma tal de Ana alta, pele branca, cabelos cacheados e a porra de uma boca vermelha e carnuda, que mais parecia a maça lustrosa e envenenada da bruxa má. Era a própria bruxa má aquela Ana!!! O eco do espelho encantado repetindo mil vezes no seu ouvido e apontando o dedo na sua cara: existe alguém mais bonita que você! Mais bonita, mais querida, mais amada, mais adorada de todas as adoradas do mundo por ele.

Era por ela aquele "sozinho" pesado e sonoro que teve que ouvir. Curtia tudo dela, tinha tudo por ela curtido e agora aqueles recadinhos cada vez mais constantes; aquela foto de ontem à noite estranha, onde não aparecia nada, mas estavam marcados os dois.

Suspirou baixinho e quase soltou um soluço de dor e de raiva. Aquela Ana ia ter o que merecia e sozinha ia ficar ela depois que... depois que nada. Nada. Não ia fazer nada. Poxa! Larga de ser criança e deixa de lamentar, criatura!

Deu de ombros para si mesma. Se a vingança era um prato que se comia frio, ainda não sabia como, mas iria se fartar.

MAMagni
Enviado por MAMagni em 30/07/2015
Código do texto: T5329476
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