O cidadão brasileiro e os princípios republicanos.

Podemos entender uma república como uma sociedade administrada com foco no interesse público, ou seja, um grupo de pessoas que aceitam se submeter a leis por elas mesmas estabelecidas, através de representantes escolhidos para tal fim. Tais leis devem visar à proteção da “res pública”, ou seja, do patrimônio comum daquele grupo de pessoas.

As leis de uma república jamais devem ter como objeto o interesse individual ou a proteção do individual, mas essencialmente, o bem comum, a proteção do grupo e de seus bens comuns. Rousseau (O Contrato Social) diz que “numa legislação perfeita, a vontade particular ou individual deve ser nula”.

Os cidadãos de uma república precisam necessariamente ser ativos e responsáveis, dotados de capacidade de administração do bem privado, ou particular, a fim de que o estado não se torne “pesado” e autoritário.

O sistema de governo brasileiro é republicano federativo presidencialista. Isso quer dizer que não temos um mandatário personificado em um monarca, ditador, imperador, etc. O chefe de Estado e de Governo (presidente da república) tem seu poder limitado pela Constituição Federal e fiscalizado pelos poderes Legislativo e Judiciário, não podendo ser visto como o único responsável pelos erros e acertos do período de seu mandato. Nossas leis são (ou deveriam ser) criadas por assembleias ou câmaras legislativas em âmbito municipal, estadual e federal, com foco na manutenção do bem comum. Essas sim, são as instâncias às quais o povo deveria recorrer, das quais deveria cobrar e exigir. Nossos municípios e estados (se estivéssemos mesmo em uma república) deveriam ser autônomos, como se fossem pequenos países unidos em uma federação, podendo legislar particularmente em grande parte de assuntos e interesses.

Mas é notório o desconhecimento da grande maioria da população em relação às leis de seu município, de seu estado e da federação como um todo. E se considerarmos a enorme facilidade de acesso que se tem hoje em dia, com a popularização da Internet, ninguém pode alegar desconhecimento de qualquer lei, ou dos processos legislativos em vigor. Com poucos cliques em um computador, tablet ou smartfone, podemos acessar todo o nosso sistema legal, desde os códigos centenários, até uma lei publicada ontem.

Maquiavel nos trás a ideia de que uma república virtuosa é formada por cidadãos virtuosos, ou seja, dotados de virtude, que cultuam a virtude. O que falta então, ao cidadão brasileiro, para que se posicione adequadamente em seu lugar na república da qual faz parte?

O que lhe falta para que seja como tantos no passado, que fizeram diferença, agindo como legítimos republicanos, responsáveis e ativos? Temos vivido nos últimos anos, momentos de expansão dos sistemas de comunicação. A cada dia nos é disponibilizado um aparelho ou um aplicativo de comunicação mais moderno, mais barato e mais acessível.

Não há como se negar esse fato. Mas é possível se observar a clara má utilização e o desperdício que se faz de tais recursos. Usa-se as redes sociais para divulgação de boatos, correntes, simpatias, mandingas e todo tipo de futilidade, numa demonstração de imaturidade que beira à imbecilidade.

Em uma república, os cidadãos devem ser ativos e participantes da política, não se deixando tornar dependentes e estando dispostos a lutar pela defesa do bem público.

O mesmo não ocorre no liberalismo, ideia que cada vez mais se assimila nos nossos dias e a partir da qual, o estado Democrático de Direito se impõe, privilegiando a legalidade em detrimento da legitimidade. O direito do indivíduo se sobrepõe ao da sociedade. Observemos que nem sempre o que é legal é também legítimo.

Há que se pensar então, se queremos viver em uma república, em uma democracia liberal, ou sob outro sistema de governo e administração.

· Queremos cidadãos ativos, capazes de defender seu patrimônio particular e ainda de lutar em grupo pelo bem comum, ou queremos cidadãos dependentes do sistema legal, que tenta (raramente consegue) proteger o direito individual, mas gera um indivíduo tão competitivo, que inviabiliza a vida em sociedade?

· Queremos um ditador que nos oprima, mas nos proteja até de nós mesmos? (monarquia – ditadura militar)

· Ou queremos um governo que não nos constrange, mas que nos rouba até a última gota de suor? (liberalismo regido pela economia de mercado)

· Ou ainda, podemos e queremos nos autogovernar, deixando ao Estado apenas as funções essenciais ao bom cuidado da coisa essencialmente pública? (neoliberalismo – estado mínimo)

· Diante disso, que tipo de governo nós queremos?

Observemos que a sociedade está em mudança, em transformação constante e especialmente, nos últimos tempos, temos visto inúmeras ações individuais e até coletivas, as quais apontam para uma insatisfação generalizada, não apenas com os partidos, com os governantes e políticos em geral, mas com o próprio sistema. Muitos cidadãos estão agindo de forma não prevista pelas convenções sociais, tanto em atos ilícitos em si, quanto em reações a esses ilícitos. Isso pode apontar para a necessidade de atualização do sistema, que já não atende às demandas.

Assim como dito por Rousseau, o estado natural do homem chegou a um ponto de não poder mais se sustentar, precisando ser substituído pelo estado civil, também as formas de administração do estado civil, de certa forma “caducam”. Há que se renovar. A evolução humana requer revolução social.

Estamos em meio a uma revolução social. Isso requer, como podemos aprender com as revoluções do passado, ações pontuais e contundentes, planejadas e muito bem estudadas. Há que se preparar para isso.