As "metamorfoses" das gerações

De Yellow Submarine a Gangnam Style, de Psicose a Vingadores –, é indiscutível que muita coisa mudou em meio século. As diferenças entre gerações se percebem todos os dias, seja no ambiente de trabalho, seja ao tentar explicar para seus avós o que é um Twitter. No entanto, é importante compreender como cada uma das gerações colaborou para chegar à situação atual. Para isso, é possível compará-las às três metamorfoses de espírito descritas por Nietzsche no livro Assim Falou Zaratustra: camelo, leão e criança.

Quando se fala nos anos 1950/60, logo vêm à cabeça vestidos de bolinha e rock’n’roll, mas é claro que há muito mais do que isso. Com o final da Segunda Guerra Mundial, nasceu a geração Baby Boomers, que hoje tem 45 anos ou mais. Tal qual um camelo, essas pessoas carregavam fardos pesados – as tantas memórias ruins da geração anterior, marcada por guerras e bombas, pela crise de 1929 e pelo forte sentimento de dever. Os Baby Boomers, então, viveram inspirados a mudar essa visão de mundo, buscando a liberdade para ser jovem. Enquanto os americanos, em época de Guerra Fria, celebravam essa juventude no Festival de Woodkstock, compravam no “estilo americano” e assistiam ao homem pisar na lua;, no Brasil, foi essa geração que lutou contra o “cálice” da Ditadura Militar. Ademais, essas pessoas também davam uma grande importância para o trabalho e buscavam estabilidade, para sustentar suas enormes famílias. Assim, hoje elas podem ser encontradas em altos cargos de empresas, de certa forma ainda carregando fardos.

Filhos dos Baby Boomers, a geração X foi além na busca pela liberdade, tornando-se a metamorfose do leão. Em sua obra, Nietzsche completa ainda a metáfora com um dragão chamado “tu deves”, contra o qual o leão se opõe dizendo “eu quero”. De fato, as pessoas dessa época quiseram muitas coisas e se opuseram a tantas outras. Foi essa geração que pintou o rosto nas “Diretas Já”, que foi punk, que buscou a liberdade sexual, que lamentou as tragédias trazidas pela AIDS, que viu a queda do Muro de Berlim, que dançou e cantou com John Travolta e que curtiu a vida adoidada com Ferris Bueller. Foram eles também que viram a invenção do computador e, desde então, acompanham o avanço tecnológico. Embora tenham maior facilidade para se adaptarem a essas inovações do que seus pais Baby Boomers, muitos deles ainda às vezes se atrapalham com as últimas invenções – embora prefiram não admitir. Além disso, a incerteza da época da Guerra Fria, na qual nasceram, se mostra também em sua personalidade e em sua carreira. Embora a sociedade ainda fosse bastante dividida em estereótipos, ao contrário da geração anterior, a X se orgulha de dizer que não pertence a nenhum deles em especial. Quanto à carreira, já procuravam maior realização pessoal, embora, a exemplo de seus pais, também valorizem a estabilidade.

Na década de 90, nasceu a geração Y – ou, seguindo a comparação, a criança, que é para Nietzsche um símbolo de inovação. De fato, os jovens (atualmente, com menos de 30 anos) têm uma autonomia muito maior do que a de seus pais e, mais ainda, de seus avós. Eles já são mais livres para expressarem sua sexualidade, suas opiniões e, sobretudo, suas diferenças. Esses jovens não são mais necessariamente rotulados como nerds, punks ou hippies, entretanto também podem ser tudo isso ao mesmo tempo. Contudo, a geração dos tablets, do “pau de selfie” e das redes sociais pode não ser exatamente “uma roda a girar por si mesma”, como descreveu o filósofo. Embora independentes em diversos aspectos, a geração Y sofre uma evidente influência da lógica instantânea da internet. Ela pode ser positiva no momento em que lhes permite fazer diversas coisas ao mesmo tempo, além de proporcionar um acesso ilimitado a informações do mundo todo; contudo, isso pode ser prejudicial à concentração. Ainda, a geração Y tem como característica marcante o hedonismo, ou seja, a busca pelo prazer. Os jovens buscam no trabalho não apenas uma fonte de renda, mas sim, a autorrealização, seguindo carreiras em áreas que de fato os atraem.

É importante, portanto, considerar as relações e influências entre as gerações. O pensamento crítico e a vontade de contestar dos Baby Boomers, por exemplo, seguiu com a geração X e ainda se percebe na Y. Conquanto os penteados e as roupas não sejam mais os mesmos, e os filmes tenham passado de preto e branco para “50 tons de Cinza”, há muitas semelhanças entre essas pessoas aparentemente diferentes. Talvez, a chave para um relacionamento mais harmônico entre elas possa ser se adaptar e compreender umas às outras. Afinal, cada uma das gerações, embora em diferentes contextos, procurou de seu próprio jeito ser jovem e teve suas conquistas, para, enfim, “metamorfosear-se” para a seguinte. Agora, é aguardar para ver a transformação das atuais crianças – metafóricas ou não.