Pote vermelho

Pensei que meu constrangimento como homem em um consultório médico ocorreria daqui a alguns anos, quando fosse fazer o famigerado exame de próstata, mas para o meu infortúnio aconteceu bem antes, não com a próstata, mas com o não menos chato espermograma.

A começar por um jejum de cinco dias. Para que tanto?

Depois de uma noite mal-dormida, chego ao laboratório. O assistente que nem sequer me deu bom dia, pergunta em voz alta que exame vou fazer. Não respondo, apenas mostro a guia. Parece que sinto, uma risada irônica. Pensei que uma etapa estava vencida, mas ele tira de uma gaveta um pote com uma tampa vermelha. Esse desgraçado não poderia me entregar quando eu entrasse na sala. Mas fazer o que? Vou sentar-me com aquele pote, que não cabe no bolso da calça, fico ali com ele na mão.

Como disse nossa sensível ministra, resolvo relaxar. Gozar, só daqui a uns minutos. Recordei que um amigo disse-me uma vez que quando foi fazer o mesmo exame, deram a ele uma Playboy da Sandra Bréia. Bem não espero a revista da Fany ou da Carol, mas quem sabe tenho sorte e encontro a Luiza Brunet, a Vera Fischer.

Fiquei alguns longos minutos aguardando com aquele pote na mão.

Até que enfim o médico chama-me. Entro naquela sala cheia de gente, mas não estou sozinho, estou com o pote de tampa vermelha, que é logo etiquetado pelo médico.

O médico manda-me entrar no banheiro. Caminho em direção a porta e sinto aquela gente toda me olhando, abro a porta, logo estarei sozinho com meu novo amigo e quem sabe com a Luiza, com a Vera ou mesmo a Monique Evans. Mas entro no banheiro e cadê a Luiza, a Vera, nem a Monique. Nada. E agora? Poderiam ter colocado uma revista da Avon, daquelas que vendem camisolas de oncinha a 19,90 ou no mínimo um panfleto da Marisa.

Nem uma cama, um sofá, um puff, apenas aquele vaso sanitário branco.

Não sei se sento, se fico em pé. Quando tinha dezesseis anos parecia mais fácil, principalmente porque não tinha que mirar num pote amigo e também não tinha do lado de fora do banheiro, uma enfermeira dando a receita de uma salada. Fica difícil me concentrar pensando em tomate, alface. Concentro-me, concentro...Agora entendo o porquê dos cinco dias. Bem, mesmo com os tomates, a alface, consigo concluir meu ato solitário e acerto em cheio meu amigo, o pote. Há vinte anos era bem mais prazeroso. Fecho meu amigo, agora não mais vazio e saio. Parece novamente que todos me olham. Agora posso ver a enfermeira que estava dando a receita, tenho vontade de dizer-lhe que da próxima vez que ela for dá uma receita em um laboratório, que seja de fruta, assim falaria de maçazinhas, de uvinhas, de perinhas.

Entrego meu amigo ao médico, sinto que é meu último contato com aquele pote de tampa vermelha, que agora, guarda dentro dele um pouco de mim.

Despeço-me do médico e não entendo porquê ele não me estende a mão. Passo de novo por aquele assistente de riso irônico, quase estendo minha mão para ele, mas como eu já tinha lavado, não serviria como vingança.

Bem, depois de hoje, até que o exame de próstata me parece bem simpático.