Nossos espetáculos cotidianos como uma ovelha que sangra e ninguém estanca

Eu me assusto muito com a burrice e a vaidade sendo vendidas como espetáculo. E isso é mais sutil. Não sangra como uma ovelha em um programa de culinária. Mas muitos compram e acabam repetindo ideologias que são vendidas abertamente e parecem ser algo legal e que deve fazer parte da sua vida.

Vejo as mulheres lutando por espaço e que seus direitos sejam respeitados. E ligo a TV de tarde, enquanto almoço, e vejo uma apresentadora entrevistar uma ex-BBB, exaltando, com afetação, o corpo maravilhoso que ela tem. "Olha esse corpo! E ela tem peitão e uma bunda enorme e uma cintura mais fina que a minha, gente!". E na hora que ela fala da bunda, ainda dá uma girada na ex-BBB para mostrar os atributos glúteos. Ou seja, se pensarmos bem, é quase como uma carne exposta no açougue para uma degustação visual. E alguns podem achar que é isso mesmo, que uma mulher deve mostrar sua beleza dessa forma num programa de TV. E não choca tanto, afinal, "o que é bonito é pra ser mostrado". Eu desliguei a TV, porque não deu para aguentar quando a ex-BBB falou do sacrifício que foi a cirurgia para colocar a bunda: "Você fica muito tempo, fazendo as coisas de joelhos. Comendo, vendo TV. Tudo de joelho".

Tenho medo de ter dinheiro demais e poder pagar alguém para fazer serviços gerais pra mim, mesmo respeitando todos os direitos trabalhistas. Já tive trabalho para oferecer, com uma grana pequena. Ficava sem graça de chamar alguém para fazer. E algumas pessoas me procuraram, dizendo que aceitavam fazer o trabalho, porque precisavam daquela grana. Pronto, acerto feito e a pessoa vai fazer o trabalho. De repente, alguém sabe disso, do valor a ser pago pelo trabalho, e logo apressa-se em dizer: "O Raul é muito escroto. Sabia que ele pagou somente X para o fulano trabalhar pra ele? É um explorador" Pronto, eu fui julgado por alguém que sabe mais de tudo do que eu.

Existem coisas escondidas nas finas películas do dia a dia. Coisas que só dizem respeito a quem faz parte do processo. Mas, alguém de fora, se acha expert e com direito a emitir uma opinião. E principalmente julgar os outros.

Hoje temos as redes sociais. Todo mundo pode dizer aquilo que quer, o que pensa (ou não pensa) a qualquer momento. Podem inventar protestos, levantar bandeiras e berrar as suas asneiras. Antes você podia fazer as mesmas coisas, dizer as mesmas merdas em um grupo seleto de amigos. Hoje a sua burrice ganha proporções. E é interessante que o próprio ser humano dá mais peso para uma burrice propagada do que uma coisa coerente e inteligente postada e visível na sua timeline.

Muitos defendem a proteção aos animais. São árduos defensores dos bichinhos, filhos de Deus. Mas não conseguem ser solidários com o próximo, não conseguem olhar nos olhos de um semelhante - isso porque muitas vezes você pode estar preso no celular que não consegue mais enxergar o mundo a sua volta. Quanto mais um ser humano que pode interagir com você! Aliás, a interação real pode assustar, já que é mais fácil e prático mandar um whatsapp, um emoticon, um inbox do que olhar nos olhos de alguém e dizer: "Obrigado, você é muito importante na minha vida".

No fundo, não me irrito mais. Antes ficava enfurecido com tantas coisas que via por aí. É, eu era mais novo. Sofria com a ignorância alheia. Queria abrir os olhos de todos. Hoje gosto de rir com as contradições humanas. Tenho um facebook repleto de pessoas que nem sei quem são. Mas são "bichinhos" do meu aquário. Elementos que uso para dar algumas risadas de vez em quando. Não que as pessoas estejam fazendo piadas. Mas elas expondo a fragilidade de suas opiniões já é muito engraçado. Eu me divirto e também faço parte da raça humana. Que riam de mim também!

Viva o nosso mundo e a enxurrada de opiniões com as quais nos deparamos em um simples deslizar de dedo pela tela touch do celular!

Dê sua opinião. Fale do reality show. Condene a elite branca. Levante bandeira em prol de uma classe. Detone a corrupção, chame o fulano de lixo, diga que um outro é imbecil. Exponha a sua foto de biquíni. Tire selfies de madrugada, sorrindo, enquanto você chora por dentro. Compartilhe aquele link que fala da criança com câncer que precisa de um doador de medula. Mostre cenas de violência que você se chocou e, não satisfeita, quer passar adiante para que outras pessoas se choquem. Mas nunca mostre o seu coração. Não sangre diante de todos. Deixe isso para as ovelhas.

Obrigado e boa rede social para você!