zé botero e a mãe d'agua

ZÉ BOTERO E A MÃE DÁGUA

Contando causo. (Estórias de beira de rio)

“Vou contá uma estória, muito dos antigamente, foi na festa do Porto XV, Nossa Senhora dos Navegantes”...

Naquele sertão distante, muito distante, lá nos cafundó onde Judas perdeu as botas, no extremo oeste paulista, já na divisa com o Mato Grosso do Sul, o majestoso Rio Paraná corria calmo e tranquilo, com suas águas claras esverdeadas, separando os dois estados. Ainda não havia ponte e a travessia do gado era feita através de balsas do Porto XV no lado mato-grossense para o Porto Tibiriçá no lado paulista. Porto XV nessa época era só uma pequena vila de pescadores ribeirinhos, composta por algumas casas de pau a pique e sapê, tipo palafitas. Tinha um pequeno armazém, que vendia de tudo um pouco. Arroz, feijão, carne seca, sal, banha e pinga. Servia de entreposto, onde os pescadores comercializavam a sua pesca. Por ali passavam muitas comitivas de boiadeiros, que faziam pouso, até o embarque das boiadas. Eles gostavam de ficar na casa daquela velha paraguaia chamada Jandira, que na verdade era um putero, onde havias umas pobres garotas perdidas na vida, que ali trabalhavam a troco de moradia, comida e roupa lavada. O lugar era animado por sanfona, viola, violão e cantorias, aquelas polcas, rasqueados, chamamés e guarânias, levantava o poeirão do salão de terra batida, dançavam até tarde da noite e isso ia até o dia amanhecer, tudo regado a muita pinga e erva mate. Principalmente no dia quinze de agosto, quando era festejado o dia de Nossa Senhora dos Navegantes, a padroeira protetora dos pescadores. Uma festa que misturava o sagrado com o profano, fé e devoção com o divertimento do povo. Isso já vinha de muito tempo atrás e foi tornando-se uma tradição muito forte. Vinha gente de toda redondeza, das ilhas, dos sítios, das fazendas e toda a comunidade ribeirinha que habitava aquelas beiradas de rio. Ribeirinhos e pirangueiros, enfeitavam os barcos e canoas com bandeiras e fitas coloridas e as rezadeiras iam cantando aquelas ladainhas rio acima e rio abaixo, assim acontecia à procissão de Nossa Senhora dos Navegantes. De volta à capela no Porto XV, o padre rezava uma missa finalizando a parte religiosa da festa. A festa profana podia começar, com muita comida e jogos. Num desses bailes do Porto XV, quando a lua cheia surgia por detrás daquelas matas e refletia a sua imagem nas águas calmas do rio, a sanfona já estava louca em acordes e escalas e a viola repicava seus ponteios e o violão marcava o compasso com seus bordões, passava da meia noite e a festa estava animada, apareceu uma moça bonita, morena dos olhos verdes e a boca cor de pitanga... O baile parou pra ver.

E assim começou a lenda do pescador e a mãe d’agua.

“ZÉ BOTERO E A MÃE D’AGUA”

Zé Botero moço novo pescador muito dos bão, tinha fama de violeiro, sabia da profissão, rio abaixo, rio acima, conhecia o Paranazão, era um rapaz valente, coragem e bão coração... Nessa noite o Zé tremeu.

A moça e o Zé Botero dançaram a noite inteira, ele tomava umas pinga e ela ria faceira e depois daquela noite nunca mais se viu o Zé, dizem que a moça era a mãe D’água encantada e o Zé levou... Era noite de luar.

Diz o povo que nas noites, quando brilha o luar, uma canoa rio abaixo, passa e da até pra escutar, o som de uma viola, que chega até arrepiar, vai sumindo lá na curva na corredeira do rio... Um encantado o Zé virou.

Essa estória eu escutei os ribeirinhos contar, ali de baixo das figueiras, beira do Rio Paraná, se é verdade eu não sei, ou se é lenda popular, eu só sei que o tempo passa e as estórias vão ficar...

Hoje é noite de luar!

Eh viola...

Hoje é noite de luar...

Eh viola!

Hoje é noite de luar...

19/04/16 - Roman Kane