Gato Preto

 
Apareceu no quintal da casa, assim, de repente. Gato grande. Preto com uma pelagem branca no focinho e no pescoço que a dona da casa  achou bonitinha.
Quando ele apareceu a mãe estava cortando o meio-quilo de carne para o almoço. O gato sentou-se sobre as patas traseiras e jogou seus olhos grandes e amarelos no vaivém do facão. A senhora deixava então cair uns pedacinhos miudinhos de carne com pele e o gato ia comendo. Depois que encheu o bucho o bichano entrou pela porta da cozinha e foi se deitar embaixo da cama, como se de casa fosse.

De tardezinha, o gato, já comido e dormido, deu o ar da graça na sala de janta. Olhou para a sua já eleita dona como quem diz "cadê a merenda?", ao que foi prontamente atendido com um pires de leite e uma latinha de água. De noite comeu baião de dois com carne de criação, como todos da casa. E foi ficando. Ganhou apreço, nome, ração e remédio quando aparecia todo esfolado das brigas noturnas com seus pares. De vez em quando trazia um presentinho, um rato, um gafanhoto, essas coisinhas de felino. Mas a mãe só veio a saber que se tratava de presentes quando a filha, gateira que só ela, chegou da capital para passar as férias e caiu de amores pelo bicho. A menina explicou não só a questão dos presentes mas também como fazer a leitura dos sentimentos do gato mediante a posição do rabo. A mãe deu risada de como a filha entendia tanto de bichanos, pois, se desde pequena a menina só sabia estar se fosse com um gato preto ronronando no seu colo!
Mas aquele gato, leitores, era diferente. Silencioso. Não dava um piu, avalia um miau. E a menina ficou muito curiosa do porquê daquele silêncio. O gato se comunicava com o olhar, eternamente com um ar blasé de quem não suportava humanos. A menina foi lá, veio cá, pegou o gato no colo, deu banho, deixou que ele dormisse em cima da cama mas qual. Como diz o Atílio, "silêncio mais sepulcral". Não, não podia ser, estava errado. Seria mudo, o gato preto? Foi então que ela teve uma ideia.

Uma tarde, o gato estava modorrando na varanda. Ela fez carinho na cabeça dele, pegou no colo, colocou-o de volta no chão cimentado, tirou umas fotos  e... tome! Deu um beliscão daqueles bem seguros no rabo do miserável.
Oh, rapaz. Pra que.

- MIAU!

E ela ficou satisfeita com a descoberta.

Meses depois, já de volta à sua casa na capital, a menina ficou sabendo pela mãe que o gato tinha desaparecido. Como veio ele se foi, assim, de repente.
Srta Vera
Enviado por Srta Vera em 27/05/2016
Reeditado em 02/07/2016
Código do texto: T5648476
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