Entre fluidez e motivação semanal

Era uma terça, acordei muito tarde e me levantei tristemente em ressaca. Fui a janela para ver o dia, e o sol já batia de frente com o alto da minha cabeça, estava muito calor como sempre. Me voltei para o leito e sentei, olhei para o ambiente que estava uma bagunça. Dei um jeito nas minhas roupas que estavam jogadas nos quatro cantos do quarto, (as joguei, no guarda roupas) me sentia um lixo por não saber o que comi na janta do dia anterior, calcei um dos meus tênis, (o mais limpo deles) peguei minhas chaves e sai, estava com fome mas não tinha dinheiro. Minto, até tinha dinheiro, mas aceitei não comer e ter fome, para ficar ocioso na praça que havia na frente do apartamento. a praça da rodoviária.

Sentei no banco em meio às árvores, as sombras e o vento caloroso. eu estava em tempos tristes, e sentar em um banco para ver pessoas, me deixava insignificante. No bom sentido, eu não atrapalhava terceiros. Fiquei ali parado por umas duas horas vendo as pessoas passarem na pacata cidade da fornalha, estava realmente muito quente. Me levantei do banco e caminhei até a avenida atravessei olhando para baixo e entrei no apartamento. Voltei pra casa tomei um banho rápido, me enxuguei e deitei na cama ouvindo músicas aleatórias de um blues morto. fiquei por ali por um bom tempo e enfim me troquei. após uns vinte minutos arrumei minha mochila, colocando livros e cadernos sujos de um pseudo aprendizado acadêmico, canetas que sempre me esqueço e um pouco de preguiça.

Peguei as chaves e sai de casa, tomei o ônibus quando já eram cinco da tarde, me sentei no primeiro lugar que encontrei vago e esperei. O ônibus andou por toda a cidade parando em todo ponto quente do percurso. Ao chegar na universidade sai andando pela calçada de entrada a passos de formiga, eu tinha muita fome naquela hora. Comecei a caminhar pela faculdade, encontrei um colega e papeamos, ele me ofereceu café de uma sala de pesquisa que ficava a esquerda do pátio principal, aceitei e tomei duas xícaras.

Eram seis e meia e a fome já tinha passado...

Fui pra sala de aula e sentei em um dos lugares de sempre, prestei alguma atenção e me desorientei... Desobjetificaçao, sono e estardalhaço mental... Foi tudo.

No término do horário curricular, decidimos eu e alguns amigos ir para um dos bares da cidade. A noite parecia ensolarada, enquanto caminhávamos pelas ruas conversando sobre filmes e coisas sem sentido. Chegamos á um dos bares, no local encontramos um pessoal da faculdade com quem conversávamos nos arredores do campus. Todos se sentaram no chão da praça, que se conectava com a calçada do bar. Me sentei e bebi pinga, e vodka com algum tipo de suco. Eram mais ou menos 23:30 e eu estava sentado no chão de uma praça a alguns metros da porta do bar. Não estava chapado ainda, muito menos os semelhantes que formavam a roda. Conversamos sobre a vida, sobre prazeres sobre sexo, sobre música, sobre tanto acúmulo individual que nem cabe a mim descrever e diluir. Uma garota olhou pra mim, como se pedisse para eu retornar o olhar, quando percebi era a mesma com quem conversei sobre astrologia a algumas semanas atrás, uma tal Céu Azul. Enfim, todos continuam falando. Eu particularmente não falo muito, observo e ouço bastante, me desligando sozinho e conversando comigo mesmo pra tirar devidas conclusões precipitadas sobre minhas abstrações.

A vodka me distraia em meio a minha pequenes, enquanto todos falavam sobre coisas legais que eu não provei e nem vou provar. Havia garotos e garotas, viagens e pensamentos todos de uma concepção tão única, que eu não conseguia me ver. Era inalcançável, ainda mais pra um cara sem ambição. Cortei mais dois dedos do copo de vodka, que descia como fogo, joguei no estômago, já esfomeado novamente, uma dose de pinga. Parei durante uns 10 minutos para sentir o queimar. Céu Azul se levantou, era alta, tinha lábios bonitos. Ela foi ao banheiro e eu voltei pra mim. Dali a pouco ela então ela abriu a porta do banheiro, enxugou as mãos e se olhou no espelho. caminhando por trás do círculo falante ela se aproximou e se sentou do meu lado, bem perto. Ela não dizia nada e estava sem nenhum copo. então, timidamente lhe ofereci um pouco da minha bebida:

- Céu... quer um pouco? Pegue um pouco.

- Vou aceitar. Aliás, você é do primeiro período de história?

Servi em um copo americano, dois dedos de vodka e 3 dedos de um suco de caixinha, se não me engano de laranja. Sem deixar cair, disse:

- sim, estou me adaptando a cidade ainda, o primeiro período é duro, como esse chão de praça.

Ela tomou um gole, sorriu e disse:

- As pessoas aqui são acolhedoras, todo mundo se ajuda um pouco, a universidade é legal e abriga muita gente, como esse chão.

Eu ri, ela sorriu também.

Nos olhamos durante um tempo, sem que nenhum dos dois se pronunciasse. Voltamos para si.

Eu fui bem tímido e um tanto estranho a ponto de não dizer nada. Sobretudo ela olhava e sorria pra mim, no chão de uma praça em uma madrugada quente e escura de terça/quarta-feira na cidade mais amável da minha cabeça.

Ela me perguntou sobre musica e o que eu gostava de ouvir. então eu disse que passei parte do dia ouvindo blues. Ela sorriu, e acanhada, ela brilhou em segundos inesquecíveis sob o meu olhar. descrevendo seu gosto peculiar. Eu ouvi. Ela terminou, sorriu pra mim e se aproximou. Então, segurei sua mão, me aproximei dos lábios limpo e naturais e a beijei em especifico bem debaixo da orelha.

Ao me afastar, olhei subjetivamente em seus olhos para que ela sorrisse novamente.

Me desliguei.

Contudo me sobraram resquícios de percepção. Eu era nada no início da tarde. porém, naquele exato momento eu era um motivo, e a tristeza já não era tão sólida.

Nos levantamos e caminhamos pelos gramados secos da praça. Chegamos onde tínhamos que chegar e paramos, ela me beijou o rosto e depois a boca.

Toda minha insignificância adormecia enquanto compartilhávamos acúmulos individuais e coisas particularmente inalcançáveis, entre nós e com o mundo.

João PS
Enviado por João PS em 16/06/2016
Reeditado em 21/06/2016
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